Bob Dylan lança sua canção Jokerman nos EUA em 1984.
Denuncia nela um ídolo com pés de barro, personagem atribuído a Ronald Reagan.
Meus
dois maiores ídolos da adolescência são judeus. O que isso quer dizer? Não
é nada, não é nada, não é nada, mesmo! Mas,
aos quatorze anos de idade o projeto de gente que eu era, não encontrava muito
prazer na própria casa ou no bairro onde morava. Veja que os tempos eram
outros, não havia internet, não havia televisão, só o bruto barro vermelho da
periferia de Maringá, pobre como a própria vida. Sequer sabia que perto de mim
floresciam personalidades brilhantes como Arrigo Barnabé e Itamar Assumpção,
nada disso. Meu mundo era circunscrito às rodas da bicicleta que me levavam de
um lado a outro da cidade, uns 30 quilômetros por dia, a recolher documentos e
entregar mensagens aos pequenos negócios clientes do escritório de
contabilidade onde eu servia como Office-boy, palavra que naqueles tempos nós
desconhecíamos, de modo que eu era mesmo “contínuo”. Até hoje não sei o que
isso significa, mas, o que eu fazia naqueles tempos temerários era mais
agradável do que o futuro grandioso que tive,
porquanto atuei como analista de sistemas e consultor de planejamento
estratégico em grandes corporações. Nada jamais substituiu o prazer de parar
num bar de estrada, sorver um guaraná gelado acompanhado de um bom pastel de
palmito!
Jorge Mautner permanece atual e irreverente, um espírito adolescente aos setenta anos de idade.
O
que isso tem a ver com judeus? Nada, exceto que meu único interesse era freqüentar a
biblioteca pública, onde tomei conhecimento por acaso de um sujeito chamado Jorge Mautner,
que havia escrito um livro chamado “Kaos, com “k””. Ali este cantor-compositor
hoje famoso e setentão, descrevia a revolta juvenil e filosofava sobre o sentido da
vida. Enquanto eu me ocupava as noites lendo essas coisas, fiz amizade com a bibliotecária, uma senhora “velha” e aparentemente sozinha,
nos seus talvez quarenta e poucos anos. Ela se interessou em saber por que
aquilo me apaixonava e passamos muitas horas conversando sobre o
existir, a vida que levávamos naquela cidade desprovida de outras atrações,
antes que eu me ligasse no movimento mais pesado e perigoso do rock and roll e
suas conseqüências paralelas, incluindo as garotinhas que iam atrás dos
guitarristas, enquanto eu ia atrás delas, dentro do movimento infinito da vida. Perdi a moça triste da biblioteca quando me mudei para Curitiba, mas, que casamento perfeito teria sido, não fosse a nossa inconciliável diferença de idades! Que fazer? Foi
ela quem me falou do segundo judeu mais influente em minha formação cultural:
Mister Robert Zimmernann.
"Como pedra a rolar" foi feita num momento de fúria, por ter sido abandonado pela namorada.
Algo assim, tão trivial, transformou-se num hino juvenil que virou mega sucesso.
Não tem nada a ver com a banda inglesa The Rolling Stones, como muita gente se confunde.
Bob
Dylan também cresceu numa comunidade pequena e fechada, muito pior que Maringá,
por que, além do frio glacial da fronteira canadense e das perspectivas
diminutas do ambiente exclusivista judeu, não tinha nem um pouco da “poesia de
todos os ninhos”, o meu espantoso trecho
da Mata Atlântica, conforme atestava o Hino de Maringá, que “adivinha a
floresta de outrora, que embalou sua vida criança”. “Há em ti o perfume das flores”, (haaa,
desculpem pela displicência mental), na
verdade, falávamos da influência de alguns judeus sobre minha vida. Ao que eu
saiba, nenhuma, pois, os dois influentes intelectuais, a primeira coisa que
fizeram foi justamente negar a herança judaica. Dylan até se tornou cristão num
curto período, por que, convenhamos, sair de uma armadilha para entrar em outra
já é karma demais, não é mesmo?
Logo
percebi que o estilo de Zimmermann, o Bob Dylan, não era diferente de Mautner, Vi também que
existia um movimento planetário identificado com o significado da palavra
“mudança”, e tornei-me imediatamente um mudancista. Passei a renegar todas as
instituições da sociedade burguesa, desde casamento, ao qual prometi nunca me
submeter, até famílias de qualquer tipo, forças armadas e justiça. Faltou pouco
para eu cair na clandestinidade da luta armada naqueles anos de chumbo. Pura
rebeldia juvenil compreensível aos 17 anos de idade!
Mas,
ficou Bob Dylan e Jorge Mautner, como fica sempre uma pedra no sapato. Cada vez que eu
me desviava para um patamar social acima, seja pela ascendência profissional
natural, fosse pelo meu próprio talento de líder, orador de grandes multidões, escritor interessante fora da linha burocrata, lá vinha o Bob Dylan sussurrar no meu ouvido os versos do “mister
tambourine man”.
Um dos mais belos poemas musicados de todos os tempos.
Dylan foi fundo na alma norte americana e compôs vários countries em sua longa carreira. São músicas de cow-boys, que ele pesquisou intensamente durante anos. Ele foi um craque na execução do estilo Chautauquia, que significa o cantar de peregrinos que andam pelas estradas da América do Norte, compondo poemas e contando causos através da música, em longas histórias sobre acontecimentos sem importância, porém representativos da cultura caipira dos Estados Unidos. Um de seus melhores momentos foi a criação do álbum "Sangue nas trilhas", de 1975. Desse álbum, Dylan nunca permitiu o relançamento ou postagem daquelas músicas em qualquer mídia social. O disco em vinil, única edição lançada, está esgotado. Eu tinha uma cópia, mas alguém a levou. Espero que tenha feito bom proveito! Uma canção se destacou, como se fosse um longo filme, contando uma aventura do cotidiano do "far west". Devido a sua longa duração e complexidade dramática, está praticamente esquecida da obra do cantor, sendo muito pouco referenciada, mesmo entre os especialistas. Chama-se "Lily, Rosemary and The Jack of Hearts". No baralho, Jack of Hearts é o apelido da carta Valete de Copas.
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