domingo, 27 de setembro de 2015

Mundos para além do visível - PARTE 2 - O legado de Blavatski





"Não tivesse ela mostrado o rumo, os pesquisadores nunca teriam encontrado o caminho"




Com estas palavras, o coronel do exército americano Arthur E. Powel homenageia sua companheira, a russa Helena P. Blavatski (1831-1891), autora de uma obra monumental chamada "Doutrina Secreta", onde ela compila a sabedoria religiosa das civilizações, desde rituais primitivos da idade das pedras até o cristianismo e o islamismo. É praticamente impossível ao leitor comum entrar no universo de Blavatski, tamanha a complexidade e a amplitude da obra. Mesmo sua versão reduzida e simplificada, alcança quase 500 páginas na edição brasileira.

A Teosofia, linha filosófica desenvolvida por Helena, foi baseada numa escola de mistérios existente no Egito por volta do ano 300 d.c., tendo como sede a cidade de Alexandria, cuja biblioteca é considerada a maior que já existiu na Terra. Foi queimada por volta do ano 500 d.c., ninguém sabe por quem, mas, provavelmente pelos cristãos romanos. Ela possivelmente continha a maior fonte de pesquisa a que teríamos acesso, caso tivesse sido preservada. Sua magnitude é mostrada no filme e livro denominado "O Nome da Rosa", do escritor italiano Umberto Eco. Em sua fantástica vida e obra, Helena Blavatski tenta recuperar o significado humanista e perene da biblioteca de Alexandria. Para isso, dedicou muitos anos viajando pelo Oriente, África e Europa, atrás do conhecimento atávico das antigas eras. Por isso, sua herança está impregnada dos aprendizados obtidos com o antigo Egito, a Índia, a Assíria e o Oriente Médio, além dos países himalaicos como o Tibet, entre outros. Na minha opinião, ela só não atingiu o manancial representado pela Ásia extrema, o que teria sido de enorme importância, mas, foi deixado à parte, pois o acesso ao Japão e à China era impossível no seu tempo. 

Talvez a maior contribuição da Teosofia tenha sido a ideia de que o mundo real existe em diversas dimensões paralelas,  diferentemente da tradição científica e religiosa ocidental. Nós aprendemos ao longo dos séculos que o mundo é criação divina, mas que Deus está num nível à parte, embora sua presença espiritual ocupe todos os espaços, quase sempre de maneira a fiscalizar o comportamento humano... O acesso a este Deus se dá de forma ritual, através de seus sacerdotes ou representantes na Terra, além das práticas religiosas e devocionais. Deve-se obedecer aos desígnios desse Ser Supremo, conforme estão expressos nos livros sagrados, a Bíblia para os cristãos e judeus, e o Alcorão para os islâmicos. Fora disso, é a barbárie.


A Teosofia chegou para dizer que isso não é a única verdade. O ser humano não se reduz aos limites de seu corpo físico-etérico e a morte não é o fim de tudo. Depois da morte física, a consciência recolhe-se no chamado Corpo Astral e a vida é levada adiante. Além do Astral existe um mundo chamado Mental e, além dele, encontra-se a melhor parte, acessível plenamente apenas a poucos seres evoluídos atualmente. É o mundo espiritual dos planos Mental Superior (ou Causal), Búdico e Átmico.


  


sábado, 26 de setembro de 2015

Florianópolis, um nome escrito à sangue




CENÁRIO DA PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA

Em 1889 era proclamada a República brasileira, em rebelião de tropas do exército sob o comando do Marechal Deodoro da Fonseca. Como sempre, as mudanças no Brasil se dão no formato de "golpe", uma vez que Deodoro era ministro da guerra do Imperador Dom Pedro II. Traiu seu chefe e se juntou ao movimento republicano, que já tinha atrás de si um longo caminho percorrido, com lideranças civis de alta formação. Lutavam desde muito tempo pela libertação dos escravos e outras mudanças estruturais na sociedade brasileira. No entanto, foram os militares de alta patente que fizeram a "república", parodiando o famoso ditado "façamos logo a revolução, antes que o povo a faça". Estes militares, até outro dia combatiam no Paraguai em nome do Imperador e sua aliança com os ingleses. Este é o Brasil, desde sempre.

A nova força emergente do Exército republicano era formada basicamente de oficiais que tinham origem na classe média urbana, enquanto os antigos comandantes da Marinha eram oriundos da elite dos nobres monarquistas, que detinham um certo controle do aparelho militar imperial. Não gostaram nem um pouco daqueles "novos tempos". Este descontentamento iria se juntar a vários outros, vindos de várias frentes resistentes a implantação definitiva do novo regime republicano.

MOVIMENTO FEDERALISTA

Em fevereiro de 1893, o Rio Grande do Sul entrava de novo em guerra civil. Os "maragatos" comandados por Gumercindo Saraiva iniciaram uma revolta armada, a que chamaram "movimento federalista", para em primeiro lugar derrubar o governo de Julio de Castilhos no RS e, em seguida,  exigir reformas constitucionais do governo comandado pelo então presidente Floriano Peixoto, alagoano como Deodoro, marechal como Deodoro, mas, duro como pedra, ao contrário do "molenga" Deodoro. A primeira reação de Floriano frente aos revoltosos gaúchos foi mandar tropas federais, através de navios das forças navais que lhe eram fiéis, para ajudar o governador do RS. Tres frentes de combate foram instaladas ao redor de Porto Alegre, impedindo a entrada dos revoltosos. Diante disso, Gumercindo Saraiva resolveu imitar a tentativa fracassada de Bento Gonçalves e "nacionalizar" o conflito, iniciando a marcha em direção à capital do país, sendo contido por outras tropas federais nas cercanias de Curitiba, onde protagonizou o histórico "Cerco da Lapa", tendo sido derrotado em seus propósitos de subir ao centro do país. Impedidos de prosseguir, as tropas federalistas retornaram ao RS e lutaram ainda mais um ano, até que foram finalmente derrotadas e assinaram um tratado de rendição em agosto de 1895. Acabava ali a aventura federalista, que deixou aproximadamente 10 mil mortos entre militares e civis. 


Um dos efeitos da tentativa guerreira dos maragatos foi a Revolta da Armada, movimento disparado em setembro de 1893 , quando um grupo de altos oficiais da Marinha exigiu a imediata convocação de eleições gerais para a escolha de novos governantes nos planos federal e estaduais. Entre os revoltosos estavam os principais almirantes da Armada, refletindo o desgosto com o pequeno prestígio político da Marinha em comparação com o Exército.  Foi neste cenário nebuloso que a pacata cidade de Desterro, capital de Santa Catarina, assistiu em 14 de outubro de 1893, na frente do Palácio hoje chamado Cruz e Souza, o comandante militar Frederico de Lorena declarar instalado o Governo Provisório da República dos Estados Unidos do Brasil. O novo governo considerava-se separado da União, enquanto Floriano Peixoto não fosse deposto. Esse Governo Provisório almejava unir os rebeldes da Armada aos federalistas do Rio Grande do Sul, com o objetivo comum de derrubar Floriano. 



Este Floriano não era bobo nem santo e, em meio a tantos problemas, largou a revolta catarinense da inexpressiva Desterro para lá e só foi se ocupar com ela em abril de 1894, quando, após ter derrotado os federalistas no Cerco da Lapa (PR), iniciaria a consolidação de seu domínio militar no sul do país. O episódio decisivo para o fim da revolta catarinense foi o combate naval travado na madrugada de 16 de abril de 1894. Do lado legalista federal estava uma frota de onze embarcações fiéis a Floriano, e de outro as forças  que representavam o último elo de resistência contra o governo. Passava das 11 horas da noite quando a frota legalista iniciou o bombardeio à Fortaleza de Santa Cruz de Anhatomirim, na entrada da baía norte da ilha. O amanhecer marcou o fim do encouraçado Aquidaban, a melhor embarcação da Marinha Brasileira, então em poder dos revoltosos. Com ele ia a pique também a Revolução Federalista e a Revolta da Armada em Santa Catarina. Tão logo a cidade do Desterro soube do resultado do combate, os membros do governo "revolucionário" catarinense fugiram para o interior do continente. Tres dias depois, chegaria à cidade o coronel Antonio Moreira César, o terrível homem de confiança de Floriano,  que lavaria em sangue o "ajuste de contas" com os revoltosos vencidos. 


Moreira César e seu time de comando



CHACINA DO ANHATOMIRIM

No comando de um contingente expedicionário do exército, Moreira César tomou conta da cidade e estabeleceu o regime de terror absoluto. No dizer do jornalista Duarte Schutel, "encheu-se de presos tudo que se podia servir de prisão". A cadeia propriamente dita, mais a câmara de vereadores, o quartel central da polícia, o teatro Álvaro de Carvalho e a Fortaleza de Anhatomirim. A tortura era utilizada como meio trivial de interrogatório. Os condenados sem sentença nem julgamento foram escolhidos à dedo, para servirem de exemplo de como a República pune com rigor os que se lhe ousam fazer confronto. Muitos inocentes foram fuzilados, degolados ou enforcados, calculando-se entre 185 e 200 executados na Ilha de Anhatomirim. Pais eram obrigados a assistir o fuzilamento dos filhos, outros tinham que enterrar em covas rasas seus parentes e conhecidos, antes de eles próprios serem mortos. 

Para coroar o escárnio, o governador Hercílio Luz, que perdera vários parentes e amigos entre os executados, decretou a mudança do nome da capital do estado, de Nossa Senhora do Desterro para a atual FLORIANÓPOLIS, uma homenagem ao "marechal de ferro" Floriano Peixoto.  

Quis o destino que o coronel Moreira César tivesse pouco tempo a celebrar seu feito nas rodas do Rio de Janeiro. Enviado dois anos depois a combater os revoltosos de Canudos, foi morto por uma bala certeira cabocla, durante a segunda tentativa do exército em tomar o baluarte de Antonio Conselheiro, no sertão da Bahia. 

Florianópolis continua tendo o nome oficial de seu algoz, mas, nenhum logradouro na capital ostenta este nome sangrento, nenhuma praça, nenhuma rua ou avenida, nenhum prédio sequer. Por outro lado, a cidade está cheia de homenagens às vítimas: Gama D'eça, Pinto da Luz, Caldeira de Andrada, Batovi, etc.  É estranho que o poder político não tenha providenciado a mudança de nome da capital.  Talvez seja a síndrome de Hercílio Luz, ou o medo de não agradar aos poderosos. Apesar disso, o povo se encarregou de mudar na prática e, nas conversas internas, poucos cidadãos se referem à cidade pelo seu nome oficial. Instituiu-se o simpático "Floripa", que acabou sendo "oficializado informalmente" pelo resto do Brasil. 



Anhatomirim, vista interna














Anhatomirim, vista do mar

















A NOVEMBRADA


Se os mandantes da ditadura militar tivessem se ocupado de saber a verdadeira história da cidade, ou se tivessem disso sido informados previamente pelos puxa sacos de plantão,  teriam possivelmente evitado a tragédia anunciada para aquele 30 de novembro de 1979. Naquele dia, o presidente João Figueiredo cumpria em Florianópolis mais uma etapa da missão que lhe impuseram os marqueteiros do regime militar. Tomar cafezinhos pelo país, afim de se fazer popular e apagar a enorme besteira que fizera alguns meses antes, quando disse que preferia "cheiro de cavalo ao invés de cheiro de povo". O regime militar tentava se prolongar, em meio a manifestações de rua que se multiplicavam pelas grandes cidades. E olhe que naqueles anos de regime militar, não existia CUT nem UNE, muito menos MST.

Florianópolis, apesar de não ser uma grande cidade,  tinha uma peculiaridade: duas grandes universidades, uma federal e outra estadual concentravam grande quantidade de jovens estudantes, daqui e de fora. Era uma reserva de mercado onde o Partido Comunista Brasileiro e outras organizações de esquerda, então ainda clandestinas, ia buscar militantes.

Nos dias anteriores, o governo havia aumentado o preço da gasolina e agora, justamente na companhia do ministro de Minas e Energia, Figueiredo tomava seu café no Ponto Chic, acompanhado de uma galera de notórios puxa sacos, entre eles o governador Jorge Bornhausen (biônico) e o secretário de obras do governo, o ex prefeito (igualmente biônico) Esperidião Amim.

Não foi gente do PCB que começou a arruaça. Foi um motorista de táxi que, indignado, aproximou-se sem despertar a atenção dos seguranças (o que os estudantes certamente o teriam feito) e desferiu um tapa na orelha do ministro Cesar Cals.

Os estudantes esperavam na Praça XV, para onde Figueiredo seguiria depois, com o objetivo de inaugurar uma estátua do Marechal de Ferro, Floriano Peixoto, certamente a figura histórica mais odiada pela população desterrense, por razões que já abordamos anteriormente. Mas, quando souberam do incidente, a estudantada correu para o calçadão da Felipe Schmidt, e cercaram a comitiva de Figueiredo. A PM baixou o pau, isolou a comitiva e a conduziu para o interior do Palácio Cruz e Souza, a uma quadra dali, na frente da Praça. De lá, Figueiredo saiu na sacada e começou a mandar o povo "tomar caju", fazendo o tradicional gesto com o dedo indicador. Recebeu estrondosa vaia de aproximadamente 4 mil estudantes, agora sim, liderados pelos militantes esquerdistas, que puxavam palavras de ordem contra o regime militar.

Irritado, João Figueiredo voltou ao tempo da caserna, esqueceu a lição dos marqueteiros e desceu para a rua, afim de tirar satisfações de um manifestante que, segundo o presidente, havia "ofendido a honra de sua mãe". Uma provável tragédia tupiniquim estava em curso, diante de um apavorado Bornhausen, que pedia "pelo amor de deus" à segurança que tirasse o presidente dali. Foi o que fizeram.

Mas, a partir daquele dia, a menção a FLORIPA passou a ser cortejada com admiração pelo resto do Brasil. Eu vi isso de perto na viagem de férias que fiz ao nordeste, durante o mes de dezembro de 1979. Aonde eu ia e dizia ser desta formosa e heroica ilha, era louvado pelas moças e invejado pelos rapazes.










quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Mundos para além do visível - PARTE 1


"A Divina Comédia". Dante e sua visão do limbo astral


--- A alma imortal fica adormecida esperando o Juízo Final, que se dará com a volta de Jesus Cristo. Se ela for considerada justa e sem pecado, vai para o céu, onde passa a eternidade na companhia do Deus todo poderoso, senão, passará a eternidade queimando no inferno.

--- A depender do nível de evolução da alma, a pessoa passa para o plano espiritual ou volta para uma nova chance com novo corpo físico.  

--- Se a pessoa ainda não alcançou a evolução espiritual, vai voltar num novo corpo físico, para continuar seu aprendizado. No caso de já ser um espírito evoluído, vai para o mundo espiritual, onde será governada por seus Orixás e poderá trabalhar no aperfeiçoamento das forças da natureza da Terra (Aiyé) e do Céu (Orum).   

--- Se o fiel não seguiu as leis divinas expressas no livro sagrado, vai para o inferno, onde queimará eternamente. Se, por outro lado, o fiel se manteve digno e tiver cumprido seus deveres, vai habitar o paraíso espiritual. No caso dos seres masculinos, terá à sua disposição 72 virgens para servi-lo. 

--- Se a pessoa ainda não evoluiu até o estado de libertação final, volta para a Terra afim de continuar a roda de reencarnações, visando suas vivências de aprendizado. Uma vez atingido o estado de iluminação, cessam as reencarnações e o espírito vai para o paraíso. 

--- Cessam todos os movimentos de vida, físicos e mentais. O corpo entra em decomposição e se une aos elementos naturais. A centelha de vida que existia no corpo, se exaure no momento do falecimento.  

Vimos acima algumas das crenças sobre o que acontece após a morte de um ser humano, de acordo com algumas religiões, tais como o cristianismo tradicional e o judaísmo, o espiritismo, a umbanda e o candomblé, o islamismo, o budismo tradicional e, por fim, o materialismo agnóstico. 

A FILOSOFIA CLÁSSICA evita fazer julgamentos sobre o que cada um acha, de modo a respeitar a "verdade" de cada linha de pensamento e de cada indivíduo em particular. No entanto, uma das funções a que se propõe é pesquisar, estudar e interpretar o conhecimento atávico da humanidade, acumulado no decorrer das eras e civilizações, registrado de forma escrita ou de forma oral, com o objetivo de responder principalmente  tres questões que considera de maior relevância:

  • Quem sou eu?
  • De onde vim?
  • Para onde vou? 
Do ponto de vista filosófico, o conhecimento se adquire de dois modos: Aquele que se acessa intelectualmente através dos estudos, para o qual o indivíduo se prepara na qualidade de ALUNO.  Outro conhecimento é aquele para o qual o indivíduo se prepara fazendo algo mais do que exercícios meramente intelectuais. Isso quer dizer,  pensando de maneira investigativa; sentindo como se fosse um devoto da questão que se encontra sob investigação;  agindo de forma pública ou reservada, de modo integralmente coerente com o aprendizado que realizou. Este é o tipo de conhecimento para o qual o estudante se prepara na qualidade de DISCÍPULO.

O conhecimento antigo das civilizações pré romanas sempre era passado de mestre para discípulo, numa relação de mão dupla, pois, quanto mais ensina, mais o mestre aprende, devidamente instigado pelas dúvidas e pelos questionamentos de seu orientando. Deste modo, o objetivo de uma Escola Filosófica nunca foi o de estabelecer a verdade como dogma, senão que basear suas ações em tres princípios, a saber:
  • O estudo deve incluir sempre o componente da devoção sentimental, juntando ao processo mental um caráter de igual amorosidade;
  • A investigação deve sempre ter o propósito de elevar o ser humano, de sua condição de Persona, para tornar-se Indivíduo (aquele que não se divide), através da Consciência; 
  • O resultado do aprendizado sempre deve servir à Humanidade como um todo, buscando o aprimoramento nas áreas da política, da ciência, da arte e da religião, com o objetivo de se atingir a SABEDORIA.


sábado, 19 de setembro de 2015

LUGARES IMPROVÁVEIS - Piratuba


Centro de eventos

Em Piratuba neste momento, 14 horas de uma tarde de setembro de 2015, faz trinta graus, com umidade relativa do ar em 55%. Vento nordeste a 18 km/h. Tudo indicaria que estivéssemos em alguma cidade do nordeste brasileiro, talvez Ceará ou Rio Grande do Norte, devido ao vento quente agradável, mas, na realidade estamos na fronteira entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul, a uns 200 km à oeste de Lages (SC), 47 km a leste de Concórdia, 90 km ao norte de Erechim (RS) e 195 km ao sul de Caçador (SC).  À uns 15 km do balneário termal de Piratuba, perto da Hidrelétrica de Machadinho, o Rio do Peixe deságua no Rio Uruguai e segue seu destino para formar o Rio de La Plata, que banha as costas de Buenos Aires e Montevideo. Um pouco antes, cavando seu caminho a partir do planalto norte através de Caçador, Joaçaba e Capinzal, o Rio do Peixe foi testemunha de uma das mais cruéis matanças de caboclos já vista em território brasileiro, ocorrida entre os anos de 1912 e 1916 nesta região, que forma o chamado Vale do Contestado.



Fotos publicadas em artigo no Cangablog


Esta guerra se chamou "do Contestado" em razão da revolta da população cabocla da região, que contestava a doação feita pelo governo brasileiro das terras que estivessem num raio de 18 km nos dois lados do traçado da estrada ferroviária que iria ligar São Paulo ao Rio Grande do Sul, outorgada para ser construída pela empresa norte americana Southern Brasil Lumber, cujo advogado era o brasileiro Rui Barbosa, que pelo visto, além de ser coroado como Água de Haia, também tinha olhos afiados para bons negócios, sem se importar muito com o fator nacionalista ou mesmo ético. O ilustre causídico, além das terras na posse dos caboclos, negociou também pagamento em dinheiro pelos serviços, equipamentos e pessoal do consórcio estrangeiro.  Mas, a construção da ferrovia, como se poderia imaginar, não era o negócio principal dos norte americanos. 


Fotos publicadas em artigo no Cangablog

Pelo negócio da desapropriação das matas virgens, já dá para perceber que eles estavam mais interessados em cortar pinheiros, a maioria deles de existência multi centenária, serrá-los in loco e exportá-los na forma de madeira para os Estados Unidos e Europa. Segundo o jornalista Sergio Rubim, de Florianópolis,  estudioso do assunto, os norte americanos serraram aproximadamente dois milhões de pinheiros, além de uma quantidade não sabida de imbuias, cedros e outras árvores nobres. Para esta tarefa que acabou com as florestas da região, os norte americanos montaram algumas das serrarias mais modernas do mundo, inclusive uma delas, na fronteira com o Paraná, foi considerada a segunda maior das Américas. A operação dos equipamentos era feita por especialistas trazidos dos Estados Unidos. As toras eram transportadas nos próprios trilhos da estrada de ferro e, para levá-las ao porto de São Francisco do Sul, a companhia construiu previamente um  ramal próprio, atendendo interesses do Estado de Santa Catarina, que tinha por objetivo o transporte da erva mate a partir da região de Porto União. Assim, juntou-se o útil ao agradável. 

Ao longo dos quatro anos de batalhas entre rudes caboclos armados de facões contra o exército brasileiro, morreram cerca de vinte mil civis e entre 1 e 2 mil militares. Os norte americanos contaram com o apoio decisivo das autoridades federais, catarinenses e paranaenses, além das forças militares do exército brasileiro e das polícias estaduais. 


AVIÃO DE COMBATE DA POLÍCIA DO PARANÁ
Utilizado como arma de bombardeio na Guerra do Contestado
(foto publicadas em artigo no Cangablog)


Nesta guerra, pela primeira vez no mundo se utilizaram aviões como arma de guerra, razão que teria levado Santos Dumont ao suicídio. “A revolta do Contestado é apenas uma insurreição de sertanejos espoliados nas suas terras, nos seus direitos e na sua segurança”, disse Matos Costa, um oficial do exército brasileiro que atuou no conflito.  


casa levantada em madeira de pinho pelos primeiros colonizadores 

Piratuba ficou de fora dessa tragédia, por que aqui não existia nada nessa época. Em 1910 a construtora da estrada de ferro montou um acampamento de obra, a que chamou Vila do Rio do Peixe, núcleo em torno do qual foram se agregando famílias de imigrantes alemães e italianos, até que em 1949 a vila foi elevada à categoria de município, passando a receber a denominação tupi-guarani Pira (peixe) e Tuba (fartura).  A grande virada na história de Piratuba aconteceu em 1964, quando a Petrobrás, pesquisando petróleo nas margens do Rio do Peixe, aqui perfurou um poço que atingiu 2.271m. Não achou petróleo, mas um lençol de águas sulfurosas a 674 metros de profundidade, em torno do qual surgiu o Balneário de Águas Termais e junto com ele o turismo. 


Hotel Germânia

As águas termo minerais de Piratuba são parecidas com as da estância de Poços de Caldas (MG), pois, além de sulfúrica é alcalina, bicarbonatada e fluoretada. Na origem subterrânea ela alcança 56 graus centígrados, aflorando na superfície por volta dos 38 graus. É considerada medicinal, especialmente para a recuperação das funções hepáticas. Também é altamente recomendada para tratamento do estômago e dos rins. 


Piscina termal coberta

Quando visitei Piratuba pela primeira vez, em 1992, o parque balneário ficava "longe" do centro da cidade, uns tres quilômetros distante, rota sobre a qual quase nada existia. O núcleo urbano era bem delimitado em torno da estrada que liga a região do Rio do Peixe até Concórdia (SC) e o Rio Grande do Sul. Ali existe uma bela ponte que cruza o rio,  e nas proximidades dela se desenvolveu vagarosamente o centro urbano nas décadas do século XX. Agora, por ocasião desta visita em setembro de 2015, fiquei agradavelmente surpreendido com o desenvolvimento  do turismo em torno do Balneário. O centro urbano, pode-se dizer que se transferiu para este lado da cidade. Além dos hotéis, que disponibilizam aproximadamente 3 mil leitos, verifiquei a existência de excelentes restaurantes, clínicas especializadas, centros de medicina alternativa, grande quantidade e variedade de estabelecimentos para prestação de serviços, comerciais, bancários, etc. 

Outra coisa que me chamou a atenção foi a construção de edifícios residenciais de alto padrão, destinados a novos moradores possivelmente de alta renda, que para cá se mudam em busca de tranquilidade, saúde e segurança. Ao contrário do que tenho observado em minha região do sul da Ilha de Santa Catarina, as construções aqui não foram interrompidas por causa da crise econômica. Pelo menos por enquanto, toc, toc, toc ...


Tres mil leitos para hóspedes se concentram no entorno do Parque Termal de Piratuba. São hotéis de padrão bem melhor que a média mundial, todos muito bem equipados, inclusive com salão de baile. Estes hotéis são ocupados principalmente por excursões de grupos da assim chamada "terceira idade". Mais mulheres que homens, como costuma ser a regra nesta fase da vida. Os homens se vão cedo, para a eternidade ou para o chinelo caseiro, e as esposas ficam viúvas literalmente de maridos mortos, mas, também de maridos vivos. Aquelas que podem, saem a viajar e se divertir. Principalmente com outras companheiras, mas, sempre de olho numa oportunidade de formar par, nem que seja para a próxima dança.


Compreendendo essa demanda, os hotéis tratam de atendê-las. Praticamente em todos os estabelecimentos no entorno do Parque se realizam bailes diários que começam às 9 da noite e deveriam terminar às 11. Noventa por cento deles animados por pequenas bandas de música gaúcha. Algumas, exageram no barulho e, se algum velhinho mais calmo quiser dormir, vai ser impossível. A noite se transforma numa promessa, provavelmente frustrada, por que faltam pares para as senhoras. Tenho pena dos garçons e dos músicos da "noite piratubense".
O público que frequenta Piratuba é basicamente gauchesco. Do próprio Rio Grande do Sul ou do oeste de Santa Catarina. São poucos clientes do litoral catarinense ou de Porto Alegre. Do resto do Brasil, então, raridade. Surpreendentemente, havia uma excursão de Posadas, Argentina. Este povo possui duas características marcantes, além da alegria e do bom humor: o gosto por churrasco e a forte orientação religiosa. Essa demanda também é suprida pelos restaurantes dos hotéis, verdadeiras churrascarias, assim como pelo comércio religioso. Esta realidade se pode ver nas frases entalhadas em madeira, expostas na calçada de um artesão: "Eu e minha casa serviremos ao Senhor", "Baita churrasqueiro, tchê", e coisas do gênero. Não é à toa que Piratuba tem uma enorme profusão de igrejas católicas e protestantes, principalmente estas que fazem o novo marketing religioso, padres cantores e ministérios temáticos. O "Ministério Miami" da igreja Assembléia de Deus renovada, este eu confesso que nunca tinha visto.






  

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

“ Está provado que só é possível filosofar em alemão ”






O estudo da filosofia lhe dá um ferramental interessante para o papel de crítico. Você se afasta da confusão do momento, se afasta para tentar compreender as razões da luta pelo Poder,  apenas pelo poder imenso que esta posição representa. Você passa a se perguntar se vale a pena se aliar ao próprio diabo, como fazem os políticos atuais, apenas pelo prazer efêmero de parecer tão  “importante” ou de possuir coisas que só lhe trazem uma segurança aparente.  Vale o sacrifício?

Desde muito cedo eu aprendi com meus avós que a simplicidade é tudo na vida. Não há necessidade de muita riqueza material, nem de ser famoso no entorno de nossas vizinhanças e suas circunstâncias pré datadas. Nunca compreendi por que uma pessoa que teve a sorte cósmica de caminhar até a consagração, que um dia foi miserável e tornou-se milionário, tenha a necessidade de estar permanentemente na luta pelo Poder. Pessoas assim viram prisioneiras de seus destinos. Estarão sempre insatisfeitas.
Nesta canção dos negros do sul dos Estados Unidos, aqui cantada por Nina Simone, fala-se de um homem que permanece livre dentro de si mesmo, ainda que esteja numa cela do presídio de Nova Orleans.



Este estoicismo filosófico de estar feliz por simplesmente SER, ao invés de TER, é o significado de SIMPLICIDADE existencial. Conta-se que o Imperador Alexandre, o Grande, ao visitar uma pequena aldeia no interior da Grécia, deparou-se com um velho e famoso sábio de nome Diógenes. O imperador perguntou-lhe do que ele precisava, pois, sendo Alexandre tão importante e rico, poderia satisfazer todos os desejos do velho peregrino. Diógenes respondeu apenas uma frase: "Gostaria que Vossa Majestade se afastasse um pouco para o lado, e saísse da frente da luz do sol, por favor".

Quando se estuda filosofia, você alcança uma visão mais verticalizada, atinge um ponto de vista à parte da confusão e pode vê-la com um distanciamento crítico diferente, aquele a partir do qual você vê a confusão sem fazer parte dela, seja na condição de comensal do regime de Poder, seja na condição de adversário político, como seria o meu caso na atual circunstância, mas, ao perceber todo o conjunto e não ver muita alternativa imediata, você vai perdendo o interesse de intervir como parte envolvida. E vira apenas um OBSERVADOR.  O caminho do observador, sem o envolvimento pessoal, é a chave para o crescimento, tanto Social quanto Individual. É necessário que se deem certas condições para a mudança em ambas esferas, para a transformação de uma realidade em outra. A principal delas, sem dúvida, é a CONSCIÊNCIA.  Além disso, é preciso ter independência pessoal, que significa não ter rabo preso com ideologias ou dogmas de qualquer espécie.



Immanuel Kant,  foi um  filósofo alemão (1724 a 1804) que faz a ponte entre a antiguidade e a idade moderna. Fundador da filosofia alemã, trata de temas complexos em sua extensa obra, que abrange temas diversos como a MORAL, o DIREITO, a RELIGIÃO e a ESTÉTICA.
Deve-se a Kant a fama de que a filosofia é algo complicado, quando, na verdade ela busca apenas facilitar a missão do ser humano, que é "encontrar a felicidade" . Desde sempre se sabe disso, mas, cada escola de filosofia encontra uma abordagem diferente. O que nas palavras de Platão se resume em um parágrafo, Aristóteles vai usar uma página inteira. Já os filósofos alemães acharão pouco o espaço de um livro.
A teoria básica da filosofia é a mesma desde os gregos. Há dois caminhos paralelos para se chegar ao topo da experiência humana. Um é o que Platão chamava mundo SENSÍVEL, o que os alemães vão chamar de EMPIRISMO. É o mundo da sensibilidade e da emoção, que o espiritualismo moderno chama de Mundo Astral. O outro é o mundo INTELIGÍVEL, que Descartes e Kant chamam de RACIONALISMO. É o mundo dos pensamentos concatenados e das ideias complexas, o que no espiritualismo se relaciona com o Mundo Mental (Kama-Manas).
A nossa civilização ocidental considera que a Razão seja preponderante sobre a Emoção. Mas, do ponto de vista de Kant, assim como dos filósofos gregos da tríade monumental (Sócrates-Platão-Aristóteles), o componente astral do conhecimento (emoções) é tão importante quanto o componente mental (lógico).
KANT passou toda sua vida numa cidadezinha da então Prússia, sem qualquer projeção nacional ou mesmo regional.  Devido a sua frágil estrutura física, teve necessidade de seguir dietas restritas e levar uma vida muito metódica. Uma piada bem humorada conta que os cidadãos da pequena Konigsberg sabiam que eram tres horas da tarde, quando o Professor Kant cruzava a rua principal para sua caminhada vespertina. Apesar de ter nascido e morrido ali, Kant era antenado com seu tempo, na medida do possível. Era assinante dos periódicos e revistas literárias de Paris, por exemplo, através dos quais acompanhou todo o desenrolar da Revolução Francesa. Essa universalidade que não se continha nas fronteiras de sua aldeia, foi que o consagraria como o "filósofo das tres críticas", por suas formulações filosoficamente inovadoras em Crítica da Razão Pura (1781), Crítica da Razão Prática (1788) e Crítica do Juízo (1790). Pode-se dizer que nesta trilogia ele vem reforçar a verdade espiritual cristã de que "não se deve fazer a outros aquilo que não queres que te façam", ou, de outra forma, foi ele quem colocou no plano filosófico a noção de que "o Direito é o confronto entre duas liberdades". Ou, ainda em outras palavras, ele introduziu a noção do DEVER, não como uma obrigação, mas, como o usufruto de uma liberdade regulada por um conjunto de regras éticas, a Lei. 
Sua obra seria fundamental na educação de Nietzsche, o filósofo que iria influenciar fortemente o fundador da Psicanálise, Freud. Assim, através de vários caminhos, Kant chega aos nossos dias. Sua herança filosófica redundaria nas tres vertentes modernas da Psicanálise no século XX, a materialista-dialética focada no condicionamento humano pela repressão sexual e formação de couraças de caráter, (Reich), a racionalista analítica   (Lacan) e a  focada na espiritualidade humana e nos arquétipos exotéricos  (Jung).