quarta-feira, 30 de maio de 2012

Memórias do rádio



Antes de seguir para o quartel,  trabalhei três anos na Rádio Jornal de Maringá, a menina dos olhos da Rede Paranaense de Rádio. Nossa programação era diferenciada, com alta qualidade musical e locução impecável, segundo o modelo da Rádio Jornal do Brasil, que procurávamos imitar. Provavelmente não dava muito lucro, mas, para isso existiam as outras emissoras da rede. Certa vez, os diretores resolveram fazer uma pesquisa de audiência e convocaram a mim e outro colega,  para percorrermos em horários alternados os bairros de Maringá, perguntando de casa em casa qual emissora estavam ouvindo. A maior parte do tempo nós ficávamos sentados na mesa de algum bar, onde preenchíamos os questionários, dando a liderança para a Rádio Jornal. O gerente de outra estação da rede nos chamou para uma conversinha. Levou junto um famoso apresentador, muito popular, em cujo programa tocava Jerry Adriani, Wanderlei Cardoso, Roberto Carlos, essas coisas. Pois em nossa pesquisa, nós colocamos o homem abaixo do nosso programa de rock and roll tradicional, apresentado por duas lindas locutoras cariocas. Elas sabiam do tesão que provocavam e iam ao programa em minúsculas saias. Dançavam acompanhando as músicas no estúdio, que tinha paredes de vidro para a Avenida Herval, onde se aglomerava uma pequena multidão masculina, a admirar as lindas coxas das morenas.  Lembro-me dessas coisas, por que estou isolado no meio do coqueiral infinito de Sauassuhy, no interior de Maceió, só tendo acesso à programação da Jovem Pan pelo canal FM da TV. 

A emissora de Maceió é a mesma de Floripa, mais outras 150 franquias da rede, que tocam interminavelmente as mesmas vinte canções selecionadas, um jabaculê mais grave que nossa inocente pesquisa de 1978. Ainda ontem, o excelente locutor anunciou a campeoníssima do dia, a qual já fez o favor de traduzir para o distinto público: "Eu não vivo sem você". E entra uma balada com fundo eletrônico, declarando que "I will never be the same, without you". É. Pode ser. Em matéria de tradução de letras musicais, parece que está valendo tudo. Bem diferente do nosso tempo!


Ainda que a Jovem Pan se anuncie como a maior audiência, aqui o que tem a preferência do povão é mesmo o forró, que toca em todas as rádios, que ouço pelas casas e pelos bares da minha vizinhança. A origem do nome "forró" é uma deliciosa piada, que não sei se é verdadeira, e passo adiante como recebi. Durante a segunda guerra mundial, havia uma base naval norte americana em Natal (RN). Conta-se que, aos domingos, os militares promoviam um baile, para o qual convidavam os mais populares sanfoneiros da região. Como o baile era público, eles o chamavam "for all". De "for all" em "for all", a língua do povo criou o forró.  


Tenho notado que o Gonzagão continua sendo o rei do baião, mas, percebo também a popularidade de outro cantor, que eu julgava acabado. Fagner. Eu tenho um amigo argentino, que vive de ensinar música, além de ser produtor de espetáculos de tango, regente de coros universitários e grande cantor de ópera. Eu lhe mostrei o disco que Fagner gravou na Andaluzia, Espanha, no início da carreira. Ele ficou impressionado: "Esto és una maravilla, todavia más interessante que aquel muchacho que canta com timbre de mujer", referindo-se a Ney Matogrosso. De fato, apesar de serem completamente diferentes um do outro, são dois grandes artistas brasileiros. Que não tocam na rede Jovem Pan. 







A rádio Jornal do Brasil faliu juntamente com o próprio, e da Jornal de Maringá desde há muito tempo que não tenho notícias. Sobraram apenas memórias de um tempo feliz. Fui demitido da Rádio Jornal, por conta de outra irresponsabilidade. Eu fazia o horário nobre da estação, operando a mesa de som das 18 horas até meia noite. Às dezenove horas, colocava no ar a "Voz do Brasil", sintonizando a rádio Nacional, conforme era nossa obrigação. Naquele dia, fomos eu e o locutor, à festa de inauguração de uma churrascaria, ali pela região central. Nos entretemos com as maravilhosas batidas de limão e maracujá. Quando dei por mim, já era quase nove da noite. Saímos em desabalada carreira até a emissora, onde chegamos praticamente juntos com o gerente, que nos demitiu ali mesmo e retirou a rádio do ar, até que convocasse nova dupla de operadores. Ao locutor ele não perdoou, embora o sujeito fosse tão bom que rapidamente conseguiu colocação numa grande emissora de Londrina, onde fez carreira de grande sucesso. Talvez ele se lembre de nossa irresponsabilidade juvenil.  Quanto a mim, que era menor de idade e pobre, porém talentoso, além de ser um dos alunos preferidos da sua esposa, o gerente me arranjou emprego como redator numa agência de publicidade.  Criando textos para super mercados e lojas de tecidos, comecei minha carreira literária. O gerentão, pessoa doce que era, acabou a vida como produtor de mel. E nunca mais eu soube da minha querida professora de geografia. Bons tempos!

  

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Zumbi, herói do Brasil


  
O Quilombo dos Palmares  estava localizad​o na atual região do município de União dos Palmares, norte de Alagoas. Era uma comunidade auto-suste​ntável, um reino africano encravado no Brasil (alguns historiadores o classificam como república, mas é pouco provável que fosse uma democracia). Era formado por escravos angolanos, que fugiram das fazendas de Pernambuco e Bahia. Ele ocupava uma área equivalente ao tamanho de Portugal. 
Em seu momento mais importante, a população alcançava trinta mil pessoas, competindo com Salvador e Recife.





Quando ainda não tinha completado 40 anos, Zumbi viu o quilombo ser invadido pelas forças portuguesas, que tinham a missão de destruí-lo e levar os líderes a julgamento, ordem comandada pelo próprio rei, para servir de exemplo a outras eventuais tentativas de revolta. O quilombo não se rendeu. Preferiram morrer, a perderem sua liberdade.


quarta-feira, 23 de maio de 2012

Cem Anos do Gonzagão


No final de março de 1973, assisti um show de Luiz Gonzaga, por conta do aniversário de Curitiba. Fazia um frio do baralho, em meio a uma chuvinha fininha típica dos campos gerais, a mil metros sobre o nível do mar. Gonzagão vivia seu esplendor, aos 61 anos de idade, famoso no Brasil inteiro e idolatrado no nordeste. Subiu ao palco encasacado em vários blusões de couro, com seu chapéu típico de cangaceiro e cumprimentou o público: “Alô, Curitiba”, destacando bem o “tiba” com a pronúncia típica dos nordestinos, e não com o “txiba” pronunciado por cariocas e outros mal falantes da língua pátria brasileira.  Como o tempo não estava para sorrisos, saiu-se com esta: “Tempo tá ruim, né não? É a natureza que chora emocionada com teu aniversário, Curitiba”, Tiba com “T” verdadeiro. Se fosse uma tarde de sol, garanto que diria que a natureza sorria emocionada. Era um grande populista. Eu só fui ao espetáculo por que não tinha nada para fazer naquele feriado, pois até nem gostava tanto do Gonzagão. Eu preferia seu filho Gonzaguinha, nosso herói político contestador, que ainda não havia se reconciliado com o pai fujão, que o abandonou juntamente com a mãe à própria sorte, fazendo com que fosse criado por uma família pobre no Morro de São Carlos, enquanto ele próprio usufruía de sua gloriosa carreira de sucesso. 



Maragogi, onde toca Gonzagão a toda hora em todo lugar.




Agora, comemora-se cem anos do Gonzagão. Eu sabia que ele era admirado no nordeste, mas, não que fosse ainda tratado como um deus. É impressionante a admiração que o povo tem por este mito sertanejo. Todas as bandas, inclusive as de música brega nordestina, tipo Calcinha Preta, estão a serviço dos cem anos do homem. Eu vi uma entrevista do cantor de um grupo de forró moderno de Alagoas, quando ele disse na TV que, normalmente, por ocasião das festas juninas, eles já se dedicam para o forró tradicional, mas, neste ano, é como se fosse a celebração do fim do mundo. Toca Gonzagão em todos os lugares e a toda hora. Ouvindo agora suas canções, com a formação musical mínima que adquiri ao longo da vida, vejo que era de fato um grande cantor. Sabia fazer com grande competência a sua arte.  No final da vida, entrou na mesma canoa furada que levou vários artistas ao declínio, quando tentou ser político. Depois de várias décadas a serviço das oligarquias, cantando em seus comícios, ele achou que poderia ser prefeito de sua cidade, Exu, no sertão pernambucano. Deu-se mal. Ele não sabia das regras do jogo e foi simplesmente descartado pelos seus antigos parceiros de campanhas. Ao povo, este pequeno detalhe passou despercebido. O que ficou foi sua imensa capacidade de entretenimento.  





Mais de quarenta anos atrás, outro nordestino intuía a importância de Gonzagão para a música brasileira, ainda que os meios intelectuais o vissem com desconfiança, principalmente pelas suas posições políticas. Lá de seu exílio em Londres, Caetano Veloso mandava uma magistral interpretação reconfigurada da música de Gonzagão. Vejam o que ele conseguiu criar em cima de algo já pronto e tradicional. Uma versão absolutamente revolucionária do baião.




terça-feira, 22 de maio de 2012

Suahssuy




Deixei o burburinho da Pajuçara e vim passar uma semana em Suahssuy. Casa ampla, com piscina e muita sombra, em meio ao coqueiral infinito. De vez em quando um som forte, "ploc", corta o silêncio da noite. São os cocos maduros despencando e batendo na areia fofa. O único valor econômico destes maravilhosos e saudáveis frutos é sua água, vendida na praia a 2 reais. E côco maduro tem muito pouca água, então, ficam lá, apodrecendo. O cajú, infelizmente foi vítima de uma praga, que deixa o cajueiro enferrujado e anulou a safra de inverno. Não há cajú nem para remédio. Em compensação, as mangas dão show de bola. Nunca comi tanta manga no pé, deliciosas, sumarentas, dividem a minha preferência com a água de coco e não sei escolher o que é melhor, sendo assim, fico com as duas. 

Allan, o dono da casa, está em Maceió, onde trabalha na companhia estadual de energia, que foi reestatizada, pois o empreendedor privado abandonou o negócio. Para não deixar o estado ainda mais escuro, o governo federal a encampou e a colocou no conglomerado Eletrobrás, que é igual coração de mãe e aceitou também outras estaduais falidas pelo Amazonas, Rondônia, Acre, Piauí, etc. Em compensação, vendeu a Eletrosul, entregando as galinhas dos ovos de ouro por uma bagatela aos príncipes belgas e franceses da Tractebel, que recebeu algumas das jóias da coroa, como as duas usinas do Rio Iguaçu. E quase fica com todas as demais usinas naquele rio, pois o governo pefelista do Paraná, no mandato de Jaime Lerner, estava entregando a Copel inteira aos mesmos felizardos. O negócio só não se concretizou por que o PT do Paraná comprou a briga e começou a criar comitês de defesa da Copel pelo estado inteiro, dezenas deles só na capital. Mais ainda, prometia uma campanha pública para boicote das faturas, assim que a Tractebel assumisse a companhia. Diante do imprevisível, e mediante o impacto do ataque às Torres Gêmeas, os belgas se encagassaram e desistiram da compra. Hoje, a Copel é seguramente uma das melhores companhias de energia do mundo, como era a Eletrosul Geração e talvez seja a Tractebel. 


Conheci Allan quando trabalhei no projeto da Eletrobrás para dar confiabilidade aos controles financeiros das empresas do Grupo. O plano era detectar os pontos falhos, propor melhorias e implementá-las. Claro que o projeto foi boicotado por todos os lados, inclusive por quem deveria zelar pela sua implantação. Alguns gestores, mais sinceros, simplesmente se negavam a assinar o relatório de Falhas, quanto mais a aceitar sugestões de melhorias. Outros, mais espertos, simulavam interesse a participavam ativamente da fase de estudos, sabendo que nunca implementariam os planos. Nenhuma autoridade os obrigava a tanto, visto que eram nomeados por políticos que continuam mandando no sistema, todos da mesma farinha com que são feitos os Sarneys. Gastou-se uma fortuna incalculável em consultoria internacional e despesas com mão de obra interna, hospedagem e deslocamento de pessoas, mas, o projeto nunca foi concluído. Não sei o que fizeram com a papelada, mas, é possível imaginar. Na iniciativa privada, gestores como aqueles teriam sido demitidos. Abrigados nas estruturas federais, nada acontece com eles, ao contrário, alguns são guindados para posições ainda mais importantes. É o jeitinho do estado brasileiro fazer negócios. Isso explica por que o projeto de privatização foi tão apoiado pela nossa população. 
Todas essas energias negativas do setor elétrico não abalaram minha amizade com Allan. Também não fazem a menor diferença aqui em Suahssuy, casa ampla, com piscina e muita sombra, em meio ao coqueiral infinito.     





sexta-feira, 18 de maio de 2012

Comparações

A renda per cápita de Santa Catarina é a quarta melhor do Brasil, com mais de 21 mil reais por habitante/ano. A de Alagoas é a terceira menor do Brasil e não chega a 7 mil reais. As populações da grande Maceió e da grande Florianópolis se equivalem, na margem calculada pelo IBGE em cerca de um milhão de pessoas. Seria excelente para um bom padrão urbano, equivalente a Barcelona, Amsterdan ou Copenhaggen,  ao contrário de muitas capitais do país, incluindo nossas co-irmãs do sul, Porto Alegre e Curitiba, ambas com mais de tres milhões de pessoas. Incomparável com o trio BH, Rio e São Paulo, verdadeiras máquinas de malucos, sem qualquer condição de qualidade de vida para o povão em geral, apertados nos trens, ônibus e metrôs, levando até quatro horas de deslocamento para ir ao trabalho. Maceió, assim como Florianópolis, tem vários problemas comuns às cidades brasileiras, mas são muito melhores do que os enfrentados pelos moradores da Penha, Cidade Ademar ou a periferia de Contagem. 

A Pajuçara não tem hora para ser admirada. Aqui, um visual na direção sul.


Por do sol se dá lá por volta de 17 horas, como em todo o nordeste.
Raul Seixas, o filme, a preços promocionais no SESI


Pelo que sei, a indústria de  Alagoas é inexistente, contando apenas com a precária produção açucareira. Nossa bela Santa Catarina, ao contrário, é uma potência nos ramos da agro industria, mecânica, tecelagem, química e tantos outros setores. No entanto, o SESI Alagoas mantém um centro cultural na Pajuçara, onde estréia hoje o filme "Raul, o início, o fim e o meio". Duvido que este filme passe em Florianópolis, assim como não passaram os filmes do Cartola e do Noel Rosa. Nossas entidades culturais, inclusive as públicas, acham que vivemos em algum canto do Alabama. E vai piorar, por que o futuro prefeito será um dos bandidos patrocinados ou pelo prefeito atual ou pelo governador. Pobre Floripa, que pensa ser do primeiro mundo. Maceió, com toda sua pobreza, te dá um banho.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Maceió



Saí de Floripa numa manhã brilhante, típica do mes de maio, temperatura em agradáveis 22 graus. Quando cruzamos o litoral do Paraná, mudou tudo. Desembarquei em São Paulo com tempo fechado, 12 graus. Se fosse em Congonhas, poderia cruzar a rua para qualquer padaria, churrascaria ou bar agradável na frente do aeroporto, afim de gastar as quase tres horas que me separavam do vôo para Maceió, mas, em Guarulhos, você é prisioneiro do aeroporto. Não tem para onde ir, a não ser caminhar pelos imensos corredores luxuosos, cheio de lojas caras e lanchonetes coloridas. Nem parece Brasil, principalmente nos preços. Com fome, pedi uma cerveja Original 600 ml e um sauichinho de presunto. Valor da conta: 33 reais. Um absurdo completo. Equivale ao preço que paguei naquela mesma noite de terça feira, debaixo dos coqueiros de Pajuçara, com meu amigo Allan, por um prato completo de camarão ao molho de coco. Cerveja a 4 reais, na areia da praia, sob as estrelas do céu de Maceió a 28 graus de temperatura. Não é uma verdadeira loucura?

Camarão ao leite de coco, com pirão e salada. Nem toquei no arroz.

Apenas começo a (re)conhecer a cidade, muito mais bonita do que a que eu vi em 1985. Problemas vários, claro, não estivéssemos no Brasil e no Nordeste. Muita gente dormindo na rua e pedindo esmolas. Poluição e sujeira pra todo lado. Trânsito caótico. Fazer o quê? Até achei que seria pior, em vista das condições políticas e sociais administradas por uma velha elite corrupta e incompetente, há tres séculos dominando Alagoas. Chega a ser mais cruel do que as oligarquias de Santa Catarina. Mas, o povo não parece infeliz. Ao contrário, aqui tudo é agradável, desde o papo no boteco, até as caminhadas das mocinhas pelo calçadão da praia.  A paisagem deslumbrante compensa todos os desconfortos e miséria. 

Orla de Pajuçara, ao anoitecer.


 

sábado, 12 de maio de 2012

Strawbery Fields Forever









"Living is easy with eyes closed,
Misunderstanding all you see.
It's getting hard to be someone,
But it all works out;
It doesn't matter much to me."



Era o "lado B" do mega sucesso de 1967, PennyLane.   Ali, os Beatles começavam a mudar a história do Rock, introduzindo arranjos especiais de orquestras ao fundo da canções, usando violinos e instrumentos sinfônicos, inaugurando um estilo que viria desaguar  nos rock progressivos como Pink Froyd. A canção  Strawberry Fields era inspirada num internato na cidade de Liverpool, vizinho do qual morou John Lennon durante parte de sua infância atormentada e pobre.  Observando a vida das crianças que lá moravam, Lennon chegou a conclusão de que aquilo não era nada do que ele esperava da sua própria vida.  As cenas que presenciou ficaram marcadas por toda a sua curta vida de astro do show business, que tão bem usou para quebrar paradigmas e divulgar a nova era, em atitudes e versos anti militaristas, como a declaração polêmica de que os Beatles eram mais populares do que Jesus Cristo (e eram mesmo), ou que "a felicidade é uma arma quente", durante a fase mais propagandista que empreendeu com sua mulher japonesa, Yoko Ono, desfraldando a bandeira máxima do movimento hippie "Faça Amor, Não Faça Guerra", enquanto com ela pousava em camas públicas e dava entrevistas bombásticas à TV americana, defendendo os Vietcongs, por exemplo, que venceram a guerra contra a maior potência militar do planeta, nem tanto por suas potencialidades bélicas, que eram muitas, mas, principalmente por conta da reação da opinião pública interna nos Estados Unidos. 

John Lennon foi um daqueles ídolos que já não se fazem mais. Inspirou uma quantidade sem fim de seguidores, inclusive no Brasil. Os roqueiros Rita Lee e os Mutantes, tropicalistas como Gilberto Gil e Caetano, gaúchos como Vitor Ramil, paranaenses-paraguaios como o Blindagem, mineiros como Milton Nascimento e todo o Clube da Esquina, além dos cearenses Fagner e Belquior, etc, e até mesmo parceiros ingleses que fariam um som diferente a partir dos anos setenta. Pronto! O Rock and Roll não era mais o ritmo negro inventado pelos escravos norte americanos ao longo do delta e da foz do Mississipi, nos anos pós guerra civil de 1860. Agora tínhamos um som universal. 

O ponto máximo da carreira de John Lennon, na minha opinião, foi a desesperada canção que fez em homenagem à própria mãe, com quem teve uma relação mais do que problemática. 











terça-feira, 8 de maio de 2012

WESAK 2012


"Assuntos de religião, futebol e política não se discute", diziam nossos avós,  do alto de suas sabedorias e experiências de vida. São temas onde dificilmente se chega  a alguma conclusão ou consenso, assuntos espinhosos que só dividem, ao invés  de somar.  Política, por exemplo. À partir de minhas próprias experiências, concluí  que é impossível se chegar a consensos sobre o assunto Política, a não ser entre aliados, o que torna a própria discussão menos agressiva, na medida em que aliados   sempre   se    respeitam  e  se colaboram,  mesmo em circunstâncias lamentáveis para a cidadania, como temos visto pela imprensa.   Em todos os demais casos, a briga é certa, com a devida exceção dos encontros entre pessoas altamente desenvolvidas, coisa muito rara.



Sítio da Mestra Cleusa, Águas Mornas, SC



O campo das religiões é ainda mais perigoso, onde cada um tem a salvação para si e para o resto do mundo, o que inclui o interlocutor que vos fala. É melhor não discutir! Sempre que posso, aceito convites para assistir rituais religiosos de amigos ou parentes, nos quais participo de forma respeitosa, sem questionar qualquer dogma ou procedimento, a não ser que sejam explicitamente maléficos, o que realmente ainda nunca me aconteceu.  

Por isso aceitei o convite feito por uma amiga muito querida, alguns bons dez anos passados, para assistir um Festival de Wesak daquele ano, que se realizou num sítio particular, em meio às montanhas do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro. Lá passei duas noites e dias repletos de maravilhas, o que veio a tornar-me não só frequentador desses eventos para os demais anos seguintes, mas também um buscador e praticante de vários princípios budistas,  na medida do possível, claro.   





O Festival de Wesak é uma cerimônia milenar budista, festiva e meditativa, que se realiza durante o período da Lua Cheia de Touro, evento planetário que ocorre quase sempre  no mês de maio e, em algumas raras ocasiões no mes de abril . Nos últimos cem anos, esta festa tem se tornado cada vez mais popular no ocidente. A maioria dos místicos acredita que este fenômeno da popularização de vários conceitos filosóficos e práticas orientais, dá-se por conta da entrada da humanidade na chamada Era de Aquarius, período de mais ou menos dois mil anos, ao qual adentramos muito recentemente, onde as energias do amor universal e da evolução espiritual estarão influenciando fortemente nossos destinos enquanto raça e astro cósmico, ou seja, o Ser Humano e o planeta Terra. Outros pensadores, mais racionais e céticos, confirmam que há, sim, uma crescente interconexão mundial entre crenças e valores de vários matizes, que resultam na integração de diferentes culturas, entre as quais o oriente e o ocidente, que historicamente sempre foram separados. Os fatores responsáveis por isso  seriam vários, nenhum deles de origem mística,  destacando-se o desenvolvimento científico e tecnológico, que torna o nosso Planeta uma aldeia global, segundo a famosa profecia de Marshal McLuhan nos anos 1970, escrita por um estrategista de comunicação social midiática, e não por um místico ou lider religioso, como poderia parecer. 









Enfim, entramos na Lua Cheia de Touro. Para os agnósticos pensadores céticos como nós, 
isso é apenas mais um evento físico, que ocorre de forma regular desde sempre. Para várias tendências místicas, no entanto, esse evento tem valores variados, mas sempre focados na questão da relação homem versus divindades, desde a tenra idade das pedras, passando pelos gregos e romanos  e chegando até nós. Os racionais que somos, eu e minha galera,  nos comportamos como analistas estruturalistas,  em pensamento lógico e sistêmico, segundo a concepção clássica científica e materialista. Jamais acreditaremos em lendas como a do Festival de Wesak. Diremos que são contos de fadas, criados pela originalidade humana, para aplacar o sentimento de solidão que nos assola cada vez mais,  mesmo à bordo de nossas bandas largas e aparelhos celulares. 

A questão que se nos  apresenta dos pontos de vista espiritual e material é que, neste momento, a Lua está literalmente "fora do caminho",  por estar ao lado da Terra no amplo espaço do sistema solar. Por isso, a vemos iluminada integralmente pelo sol. Ela própria não tem luminosidade nenhuma, conforme nos explicou o mitológico álbum "The Dark Side of the Moom", do Pink Froyd. Por estes dias, a ligação entre o Centro Solar e o planeta Terra está em seu ponto máximo, o que nos possibilitaria aproximarmo-nos de uma tal energia que poderia ser definida como "Deus", na verdade, a energia criadora, o centro da Vida e da Inteligência, pelo menos na nossa.galáxia, senão pelo universo inteiro.  




Estes momentos são propícios para mobilização das massas dos homens e mulheres que responderam aos ideais de amor e paz,  que foram lançadas pelos Mestres ancestrais desde o início da humanidade na Terra, seres iluminados como Lord Gautama Buda e Jesus Cristo. Nesta última solenidade do Wesak, eu particularmente não pedi nada pessoal aos divinos seres. Apenas compreensão internacional, interdependência econômica e unidade para a paz mundial. É o festival de Wesak.









terça-feira, 1 de maio de 2012

Encantos e Cantorias em Imbituba


Ainda hoje se pode ver pelas imensas dunas e restingas do litoral de Imbituba o famoso cipó imbé, como chamado pelos índios Carijós que habitaram aquele trecho por tempos imemoriais. Era o material básico na prática da pesca, a principal ocupação dos indígenas e também dos pioneiros açorianos, que aqui desembarcaram lá por 1720 e, embora a atividade tenha se tornado indústria de alta tecnologia, ainda é utilizado nas lidas artesanais, graças a sua surpreendente resistência, que pode durar cinquenta anos ou mais, mesmo submersos nas profundezas oceânicas. Além da utilidade nos serviços da pesca, pintam de verde o branco predominante nesta terra dos imbés em abundância, a nossa Imbituba. 



Não sabíamos nada disso quando embarcamos no ônibus, às 07:30 da manhã de domingo em Florianópolis, sob os primeiros frios do inverno. Assim como ainda não sabíamos das hospitalidades e amabilidades dos imbitubenses da Vila Nova, pequena comunidade que foi fundada muito antes de Imbituba, propriamente dita, por que seria ali a sede da missão religiosa que por lá chegou com o objetivo principal de catequizar os Carijós. Eram tempos ásperos aqueles de 1620 e os sacerdotes encarregados de implementar a missão foram expulsos por guerreiros portugueses e espanhóis, que não queriam ver seus virtuais futuros escravos sob a proteção papal. Assim, a Vila Nova voltou a ser apenas um território Carijó selvagem por mais cem anos, até a chegada dos açorianos.

Vila Nova de Imbituba. Onde chegaram os primeiros brancos, em 1620. 

Assim que chegamos, encontramos nos esperando as nossas amadas irmãs nativas da terra, Mada e Rosa. Tinham como presente para nós um docinho feito com farinha de mandioca e amendoim, com certo nome estranho e difícil de pronunciar, além do reconfortável café da manhã que a Paróquia de Santa Ana nos oferecia. De nossa parte, levamos também um presente para a Rosa, na figura do seu cambaleante, porém firme cravo, o Pedro, apoiado em sua bengala pós cirúrgica.  

E iniciamos as cantorias.




Leínha, emocionada com o próprio encanto.
Talvez fôssemos mil ou mais cantantes, entre sopranos, contraltos, tenores e baixos. Alguns grupos mais sofisticados ainda se davam ao luxo de apresentar vários solistas, além de especialistas mezzo-sopranos e barítonos, nas receitas de arranjos dos naipes de cantantes, que nos mostravam suas emoções sobre o pequeno palco formado no altar da igreja histórica.  Tecladistas e guitarristas vários acompanhavam os cantantes. Não raro, as mocinhas desciam do palco sob  a forte emoção do choro, visto que aos marmanjos esses arroubos são devidamente reprimidos, por não serem bem vistos pela moral coletiva ocidental machista, mesmo que algumas lágrimas furtivas insistissem na tarefa de molhar nossas faces levemente ruborizadas, preventivamente enxugadas às pressas, antes que a nossa realidade emocional interna fosse denunciada. 



Maestro Robson e algumas de suas centenas de cantantes.






A platéia se encantava a cada nova presença no palco-altar. 
No final da tarde, ouvi muitos moradores de Imbituba se perguntando, "será que o maestro Robson ainda vai se apresentar com algum de seus coros?"
Eu, intrometido que sou, para variar, disse que "sim, ele ainda vai nos reunir para encerrar o Encontro". Então,  meus confidentes reafirmavam sua admiração: "ha, se é assim, não dá para ir embora, temos que esperar!".   Com a chegada da hora do ângelus, todos os corais presentes cantamos juntos a última canção. 
E o domingo musical de cantoria veio conosco, de volta, destinado a ficar gravado em nossa memória, tais quais as lembranças boas que embalam nossos sonhos na dura batalha do cotidiano de cada um. Até que um próximo encontro nos anime a repetir tudo de novo.