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Que Saudade do Bar do Chico!
As
ruas de Botafogo estão abarrotadas de apressados cariocas de classes médias,
loucos pra pegar as suas vans e ônibus suicidas, trens e sei-lá-mais-o-que,
pra ir não-sei-pra-onde. Em meio ao “calor humano” das encardidas ruas de
Botafogo você quer chegar logo em Copacabana, para um ou vários chopps que
façam esquecer o trabalho de sondar “processos de negócios”, para encontrar
neles misteriosos Controles Sistêmicos, que “mitigam” ameaçadores Riscos.
Isto quando não tem o azar de identificar de cara um “Gap direto”, que leva
diretamente ao nocaute. De fato, convém esquecer destas coisas por algum
tempo. Agora, neste barulhento boteco da Siqueira Campos com Barata Ribeiro,
você, pelo menos, está só a duas quadras do seu hotel e o chopp geladíssimo à
sua frente lhe faz lembrar de um mergulho nas ondas do Campeche, Floripa,
numa luminosa manhã de domingo. Aí, você diz para o bolinho de bacalhau:
"Que saudade do Bar do Chico!".
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O senhor é do Ibama, moço?
Estava
trabalhando em Manaus. Cansado de tomar chuva no lombo, resolvi
pegar um ônibus e conhecer Itacoatiara, talvez uns 200 km Rio Amazonas
abaixo. O calor era intraduzível, mas, à margem esquerda do famoso rio tudo
era encantamento. Deslumbrantes paisagens, povo simpaticíssimo, mulheres
belíssimas. E um belo restaurante à margem do rio. Peço o cardápio e verifico
que os peixes são todos de cativeiro. Curioso, pergunto à garçonete:
"Vem cá, esses peixes de cativeiro são muito diferentes dos naturais?"
Ela responde: "Não, moço, aqui não temos peixes de cativeiro." Eu
replico: "Mas, está escrito aqui, no cardápio", então ela esclarece:
"Haaa, isso é pra enganar o Ibama, pois, como estamos na época do defeso,
é proibido pescar. Se vier o fiscal, mostramos o cardápio!" Dando-se conta da mancada, apavorada, pergunta: "Ai, ai, ai, moço, o
senhor não é do Ibama não, né?"
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Como é o nome do hotel?
O
trânsito em Paris estava infernal naquele 16/06/2001 e o carro alugado deveria ser
devolvido até 6 da tarde. Decidimos devolvê-lo no aeroporto de Orly, situado fora do centro e, portanto, mais acessível. Achamos um simpático hotelzinho na vila, deixamos as malas
e devolvemos o carro na locadora. Aliviados, procuramos transporte para
retornar ao hotel, quando nos perguntamos um ao outro: "Como é mesmo o nome do
hotel?" Na pressa, esquecemos de pegar sequer um cartão do tal hotel. Perambulamos
tentando juntar detalhes que ajudassem a achar o local de nossa hospedagem. Nada. Cansados, sentamos
num bar e pedimos uma água mineral, em inglês, tentando obter alguma
informação do balconista. Nada, de novo. Num certo ponto, trocamos entre nós algumas
palavras em português, ao que o "patrício lusitano" exultou: "Ora, então por que não
falamos nossa própria língua?" Imediatamente chamou esposa e filhos para
ajudar e, rapidamente, deduziram que o hotel só podia ser o "Le Rouge". No
outro dia, fomos lá agradecer e ele se recusou a cobrar a meia dúzia de
"geladas" com as quais celebramos a sorte: "Um dia tu me pagas
lá em São Paulo, quando eu for visitar meu primo que mora no Brasil".
Acho que ele nunca veio ...
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Je ne parle pas le français
Após
um tremendo feriadão de 1º de maio em Barcelona, com direito a ouvir a
multidão cantar a "Internacional Socialista" na festa, saí numa manhã de quarta feira para
tomar o trem que me levaria ao sul da França. Na plataforma certa, com folga
no horário, fui percebendo uma crescente angústia, pois não falava patavina de
francês e pressentia grandes dificuldades para os próximos dias. Era a
primeira vez que viajaria por um país cuja língua não fosse português ou
espanhol. Pra sair daquele estado d'alma desagradável, puxei conversa com
outro sujeito que também esperava o trem. E não é que o cara responde em francês?
Quase entrei em pânico e disse simplesmente "pardon, je ne parle pas le
français".
E ele: "Oh, desculpe, como vais para a França, julguei que fosses francês".
Desfeito o engano, continuamos com um proveitoso papo no bom e velho
castelhano.
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A VIDA É UMA GRANDE VIAGEM | |
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Mendigos Escandinavos
Sim,
eles existem. Na maior parte são drogados, gente que perambula durante o
curto verão escandinavo. Certa vez, em Oslo, um deles veio pedir-me esmola. Quando respondi que não entendia sua língua, o danado caprichou no inglês. Em
outra ocasião, quando estava embarcando para Copenhagen, Dinamarca, a oficial da companhia solicitou documentos a um jovem maltrapilho que tentava embarcar no navio. Ele aprontou uma
confusão dos diabos, questionando, lá na língua enrolada deles, por que ela não
exigia documentos dos demais passageiros. Dizia que estava sendo discriminado por causa de seus cabelos
negros, uma raridade em meio ao mar de louros vikings. Não me pareceu que
fosse racismo, mas, exclusão social, pois era evidente que se tratava de um
imigrante, talvez árabe, além de sua condição de outsider social. Não deixou de ser curioso perceber a forma educada e gentil com que foi tratado, apesar de seu comportamento violento. No nosso país teria levado logo uma dura da polícia.
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Feijoada Cubana
Sentada perto de
mim no avião estava uma senhora cubana, que não falava uma palavra em português e, com seu sotaque enrolado, a conversação ia difícil, amenizada apenas pelo formidável Habana Club, anejado 8 años, que animava a madrugada e encantava a todos nós naquele vôo em novembro de 1994. Quando aterrisamos em Havana já éramos mui
amigos e ela pediu-me um favor: "Como cubana, não tenho chances de
passar este pacote de feijão preto, que trago pra fazer uma feijoada; mas, a
você, como turista, no le van a importunar. Hace-me el favor de passar-lo?"
Provavelmente ainda sob o efeito do rum, imprudentemente aceitei o desafio e
coloquei o pacote na minha mochila, que foi aberta quando passei
pelo raio-x. O inspetor, com o pacote de feijão nas mãos, me perguntava a razão daquele aparente e insensato delito. Depois de muita explicação e de apontar a verdadeira dona, fui liberado
rapidamente e não sei o que aconteceu com a senhora cubana. Então, eu me dei conta do que teria acontecido comigo se, ao invés
de feijão, o pacote contivesse uma bomba, por exemplo.
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Tres ovos para quatro famintos
Em
1993 viajávamos dois casais num "golzinho" 88, voltando de Arequipa, Peru. Somente em La Paz descobríramos que não seria possível voltar por
Corumbá, como planejávamos, pois simplesmente não havia estrada. Então nos recomendaram voltar
por Jujui, Argentina, depois Asuncion, Paraguai e entrar por Foz do Iguaçu.
Foram mais de 500 km de estradas de chão pelos Andes bolivianos. Dias
das mais fantásticas aventuras, por caminhos de belezas absolutamente
embriagadoras no altiplano andino. Mas, também de muita privação. Certa ocasião, depois de mais de dez horas sem comer, finalmente chegamos numa vila.
Havia um único boteco aberto, com uma pobre boliviana atendendo suas várias crianças e o balcão. Não havia comida, exceto biscoitos,
cerveja e três ovos. Imediatamente requisitamos os três ovos e pedimos que
fossem cozidos, pois eram tempos de cólera. Neste momento, pra demonstrar o espírito solidário do ser
humano, a mulher do meu amigo gritou: "Dois são meus!".
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terça-feira, 25 de junho de 2013
A vida é uma grande viagem - em sete capítulos
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