sexta-feira, 9 de março de 2012

Conservatória, onde os grilos são astros.


O grande apelo turístico do Brasil são as praias. Claro que a Amazônia e outras belezas naturais também atraem turistas, mas não se compara com o fascínio exercido pelo litoral. As únicas montanhas apreciadas pelos turistas são o Pão de Açúcar e o Cristo Redentor, de preferência admiradas a partir das areias das praias que estão visíveis desses dois pontos, Copacabana, Ipanema, Leblon, etc. Por isso, a Serra Fluminense não é tão conhecida, exceto por alguns nichos muito específicos, os amantes da natureza, por exemplo, que vão passar seu tempo de folga nas imediações de Visconde de Mauá e Itatiaia, na Serra da Mantiqueira. Também é bastante comum que as famílias da classe media alta carioca tenham suas chácaras e casas de montanha nas cidades de Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo, mais perto da cidade do Rio de Janeiro e oferecendo maior conforto e variedade para o consumo desse público mais interno (se bem que, ultimamente, essas cidades encontram-se em certa decadência, devido às várias enchentes sofridas pela região nos últimos anos). Por isso foi com surpresa que os integrantes do Coral Eletrosul receberam a sugestão vinda de um colega, para que participássemos do festival de coros programado para a cidade de Valença, aliás, para ser mais exato, no seu distrito chamado Conservatória, situado a 600 metros de altitude, numa região de serra no estado do Rio de Janeiro.  

Conservatória, distrito de Valença (RJ)


Saindo de Volta Redonda, às margens da Via Dutra, pega-se uma estrada tranquila e agradável, que vai até o entroncamento de outra grande estrada, ligando Belo Horizonte ao Rio, nas cercanias de Petrópolis. Ao longo do trecho de aproximadamente 150 km, estão as terras férteis que receberam as primeiras lavouras de café no país, ciclo econômico do qual herdaram grandes e imponentes fazendas, em meio a ondulação de montanhas que variam de 500 a 1500 metros de altitude, revezando paisagens bucólicas e cidades históricas. As cachoeiras e corredeiras para esportes radicais, também se revezam com rios tranquilos e limpos, bons de banho e pescaria. A população local junta a simplicidade e a ingenuidade dos mineiros, com a alegria e a musicalidade dos cariocas. Da mesma forma, a gastronomia atende aos dois apelos, o caipira e o afro-brasileiro. As excelentes cachaças da região abrem o apetite para os pratos típicos da cozinha mineira, embora estejamos do lado de cá da fronteira com Minas Gerais.

Estive uma única vez em Conservatória, na década de 1990, levado não pela fama de seresteira que a cidade ostenta, mas, atraído pela tragédia que se abateu sobre sua artista maior, a cantora, compositora e instrumentista Rosinha de Valença, que teve um acidente vascular e ficou em estado vegetativo por longos 12 anos, até morrer em 2004.  Eu pretendia visitá-la no hospital, para se ver o tanto que eu gostava daquela  pessoa, mas, o único contacto que obtive foi conversar rapidamente com o irmão dela, que me informou da proibição de visitas, algo mais que compreensível. Emocionado até as lágrimas, ele disse que o único que entrava em seu quarto e passava horas tocando violão para ela (como se ela pudesse ouvir), era o seu discípulo Raphael Rabello, um rapaz que ficou pouco tempo entre nós, mas, na sua curta passagem foi um dos mais geniais violonistas da música brasileira. Eu, volta e meia, me pergunto a deus  por que estranhas razões certos artistas sensíveis e inspirados, como esses dois,  se vão tão cedo para a outra dimensão, enquanto facínoras e estúpidos duram tanto nesta terra.

Rosinha de Valença teve fama internacional, em várias tournés à volta do planeta, incluindo mais de cinquenta países. Fora os Estados Unidos, onde  protagonizou sucesso espetacular com a banda Sergio Mendes e Brasil 66.  Depois que se consolidou artística e economicamente, voltou à sua Valença, de onde saia apenas para visitar amigos e matar as saudades do Rio de Janeiro, além de ocasiões especiais, como a tourné que fez junto com o grande multi-instrumentista Sivuca. No mesmo ano de sua morte, sua amiga Maria Betânia juntou vários artistas do círculo de amigos que dividia com Rosinha, gravando um álbum em sua homenagem, onde estão algumas de suas obras primas, uma delas cantada pela própria Betânia. O  violão que ornamenta a voz angélica de Maria Betânia é de Turíbio Santos.



Outro que participou do álbum foi Chico Buarque, em dueto com sua sobrinha Bebel, a filha de João Gilberto e Miúcha.
















3 comentários:

  1. Alguém pode me explicar o que está acontecendo???
    Quase 1500 acessos...

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  2. Explico!
    Embora não pareça, entre nós, os brasileiros, que vivemos num país que não dá muita importância para a divulgação e expansão da cultura, há muitos que gostam de cultura. E, você é uma pessoa que só não gosta como também divulga preciosidades como esta. Acho que consegui explicar, um pouco. Ao que parece, nem só de Samba e Futebol vive um país. Fui bem?

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  3. Dez dias depois, e já estamos com 1600 acessos. Impressionante! Quem é essa gente? Milagres da nova era...

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