domingo, 5 de fevereiro de 2012

Lisboa, velha cidade.

Rua Augusta 
e o portal que dá acesso à praça do porto de Lisboa

Video sobre Lisboa



Somente esta cidade poderia produzir um poeta como Fernando Pessoa.   Lisboa é um milagre da história e da natureza.   Seus cenários mirabolantes estão desenhados com o azul do Rio Tejo e o verde das colinas, as variadas culturas convivendo ao mesmo tempo sob a proteção da estabilidade milenar católica e indissolúvel, o (des)encontro de civilizações que diariamente se observa em suas pequenas ruelas e largas avenidas, o mar que entra rio adentro, os castelos medievais de Sintra, ao norte, e Setúbal ao sul, como a darem proteção para os deslumbrantes monumentos futuristas ao redor da Estação do Oriente,  tudo isso conduzindo a uma capital absolutamente diferente das suas similares europeias, sempre tão certinhas e tão previsíveis.  Lisboa vive das contradições da alma lusitana, assim como viveu o poeta.  “Dá-me de beber, pois não tenho sede”, tanto pode ser apenas uma desconstrução da lógica como também uma profunda reflexão minimalista sobre a luta do ser humano contra o tédio de uma existência sem utopias, o grito desesperado do poeta contra a falta de sentido para a vida.  

Chiado, o bairro da boemia.



São três milhões de habitantes na grande Lisboa, o que equivale ao tamanho da grande  Curitiba ou Porto Alegre, com a qual Lisboa tem pelo menos uma semelhança:  ambos os rios estão no centro das origens e tradições das duas metrópoles, com a diferença que o Guaiba forma uma grande lagoa e o Tejo se transforma numa baía para receber as águas salgadas até abrir-se definitivamente para o Atlântico.  A capital portuguesa se origina no ponto mais estreito do rio, onde se lhe fixaram a Ponte Salazar, cruz-credo, em boa hora rebatizada 25 de Abril, uma linda data para lembrar a revolução dos cravos.   Por aquelas paragens está o Porto de Lisboa, de onde saiam as caravelas para redesenhar o mundo. Defronte ao porto se inicia o conjunto arquitetônico formado ao longo da história, constituído pela Ribeira e o Chiado, de um lado, e pelo Castelo de São Jorge de outro, monumento imponente sob o qual se espalham importantes edifícios milenares como a Igreja onde está sepultado Santo Antônio e a Catedral da Sé, símbolos católicos encravados no bairro muçulmano da Alfama.



Centro Histórico de Lisboa 
e o Castelo de São Jorge aos fundos














Ao centro, bem defronte ao porto, está a Praça do Comércio, que se liga ao Largo do Rocio através de diversas passagens importantes, a bela Rua Augusta sendo a principal delas,  ladeada de bons restaurantes e finas lojas de moda e prataria. Todo este conjunto do centro foi totalmente destruído no terremoto de 1760, do qual salvaram-se milagrosamente os prédios da Alfama, que conservou suas características tipicamente medievais e árabes.  Foi o Marquês de Pombal, nome de uma das mais importantes praças da cidade quem coordenou a reconstrução, resultando numa cidade moderna, de ruas largas e prédios estilo greco-romano. Dizem as más línguas que para tocar essa obra ele achacava cada vez mais os súditos compatriotas d’além-mar, que viviam num lugar chamado Brasil, aperto este que veio a resultar na Inconfidência Mineira. De resto, o centro de Lisboa está repleto de coisas do Brasil, e não só na madeira nobre de seus palácios ou no ouro de suas igrejas, mas também na cultura e no comércio.  É Casa Amazonas aqui e Padaria Niteroi ali, por todo lado. Conheci duas casas “A Brasileira”, uma cafeteria no Chiado, que talvez seja a mais famosa da cidade, e uma confeitaria na Rua Augusta, que faz o melhor pastel de belém do mundo, melhores que os originais, de Belém mesmo, que está alguns quilômetros rio abaixo, com sua famosa Torre, construída lá por 1530.  


"Senhoras e senhores, à sua direita o Mosteiro dos Jerônimos"


Daquela mesma época é o edifício que está bem pertinho, o Mosteiro dos Jerônimos, uma relíquia arquitetônica inigualável. Aliás, todo o bairro do Belém é muito imponente, pois foi construído justamente para impressionar aos navegantes do mundo inteiro, que entravam pelo Tejo em direção ao porto de  Lisboa, afim de trocar suas mercadorias pelos produtos que os portugueses traziam de suas colônias espalhadas pela América, África e Ásia.   Porém, quando construiram o Mosteiro dos Jerônimos eles exageraram na dose. Não é possível descrever em palavras a beleza e a grandiosidade do lugar. 

Quando o rio acaba, iniciam-se os balneários e bairros residenciais da costa do Atlântico, culminando em Estoril, com seu famoso cassino, e Cascais, onde os lisboetas vão tomar “banho de mar”.   Na volta ao centro, convém sair da praia de Cascais e subir alguns quilômetros até Sintra, onde estão dois castelos, um mouro e outro cristão. O castelo mouro vem do tempo em que vários locais em Portugal foram convertidos em redutos árabes avançados, pontas de lança dos reinos mouros estabelecidos na Andaluzia, bem mais ao sul.   Quando esses territórios voltavam às mãos cristãs, reconquistados pelas armas, normalmente os gran-senhores e reis os ocupavam com suas cortes, não sem antes adaptá-los para o catolicismo e seus costumes, o que quase sempre implicava graves perdas arquitetônicas. O mais imponente sítio árabe na Europa é certamente Allambra, em Granada, e talvez tenha sido também o mais bem preservado, mesmo assim o português Carlos V, quando ocupou também a coroa da Espanha tratou de construir um novo palácio para a corte, bem na frente do principal castelo do rei mouro,  descaracterizando todo o conjunto arquitetônico. Felizmente, em Xentra (como era chamada pelos mouros) não houve nada disso, pois o rei cristão decidiu construir o seu castelo bem no topo da montanha, de onde se descortina todo o território ao redor. Assim, preservou-se o castelo mouro, o qual, confesso, me pareceu mais simpático, estampado  escandalosamente contra o verde da montanha e os casarios coloridos da vila.   Sintra tem seu charme especial nas ruelas tortas que despencam de repente em paredões de pedra, ainda que também possua arborizadas avenidas e shopping centers. Percebe-se que por ali mora gente muito rica. Voltando pela “linha de Sintra” nosso trem passa em vários bairros de Lisboa, alguns mais bonitinhos, outros verdadeiros pombais, até retornar à Estação Central no Rocio.


Sintra, ou Xentra, 
conforme era chamada pelos fundadores árabes


Estação do Oriente
complexo de mobilidade urbana 









































Para cruzar o rio e ganhar o Alentejo há duas pontes, ou melhor, complexos de travessia, pois por ali se passa todo tipo de infraestrutura, desde cabos e canos até carros, ônibus, bondes e trens. Do outro lado estão vários municípios “dormitórios”, digamos assim, que vivem em função da capital, além da zona industrial.   Se subirmos o rio em direção à sua nascente, vamos para o Ribatejo, mas, bem antes disso estão os monumentos construídos para a grande exposição mundial de 1998. É lá que estão os edifícios e hotéis mais caros e chiques da cidade, onde fica a Estação do Oriente, um complexo de mobilidade que inclui trens, metrôs e ônibus, conectada com o ambiente da exposição e o também famoso Oceanário, aos pés da Ponte Vasco da Gama, com seus 14 km de travessia sobre o Tejo. 

A grande atração ao sul, depois de cruzar o rio, sem dúvida é Setubal, que tem vida própria e parece um grande centro comercial, com seu próprio porto e tudo.   Até um time de futebol próprio eles têm, o Vitória, se bem que isso não seja grande vantagem, já que muitos bairro de Lisboa, como Benfica, têm seu time profissional, inclusive um tal de Amadora, mesmo nome do distrito, último classificado do campeonato português.  Setúbal também tem suas praias, seus belos monumentos, seu castelo, seus mouros e tudo a que tem direito, como qualquer boa cidade portuguesa, só que tudo bem mais barato que Lisboa. Entretanto, não recomendo ao turista brasileiro aproveitar o fator preço e hospedar-se em Setúbal, pois, além de ser longe do centro da capital (uns 40 km), trata-se de uma cidade um tanto perigosa, onde tive uma experiência não muito agradável, que passo a contar; Caminhando tranquilamente pelas ruas, ia fotografando tudo que me parecia interessante. Ao passar pelo bairro antigo dos mouros, fotografei uma ruela e não vi que nela havia um grupo de pessoas se drogando na via pública. Quando percebi a cena, tratei de dar meia volta, mas já era tarde!  Tres gajos vieram em minha direção gritando “dá cá essa porcaria de máquina” e quando eles estavam bem perto eu disse o mais firme e forte que podia: “Eu não fotografei ninguém, carvalho, e se vocês derem mais um passo eu chamo a polícia". Aproveitando o impacto que meu sotaque e a palavra “polícia” havia provocado, deixei rapidamente o local, sem olhar para trás.  Só percebi que eles atiravam pedras quando estas bateram em alguns carros pelos quais eu passava com pressa.




            


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