sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Santiago del Estero, o Piauí da Argentina.


A renda per cápita mais rica das cidades da América Latina pertence a Brasília, com mais de 24 mil dólares produzidos por habitante. Para se ter uma idèia,  Florianòpolis, considerada uma cidade rica, nao chega a 5 mil dòlares anuais. O PIB total de Brasìlia è incríveis 52 bilhoes de dólares, ficando abaixo apenas de Rio e Sao Paulo. Supera cidades altamente industrializadas e ricas, como Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Salvador e Recife. Considerando-se que Brasília só produz governo e articulacoes políticas, que rendem muito dinheiro mas nos locais que suas excelëncias representam e nao em Brasília, este è um resultado absurdamente alto, daqueles que, ao invès de serem comemorados, deveriam ser lamentados, pois indicam profundo equìvoco.

A Argentina tambèm indica grande concentracao de renda no segmento governo. O PIB per càpita da capital federal, Buenos Aires, é 15 mil dòlares anuais, enquanto o da Provìncia de Buenos Aires, que faz o entorno da capital e se estende por larga extensáo do pampa argentino, náo chega a US$ 4 mil per càpita. E olhe que esta provìncia è disparadamente a mais rica do paìs. A provìncia mais pobre, Santiago del Estero, no ano de 2010 produziu o equivalente a 1700 dòlares por habitante.

Nùmeros frios, assim, realmente nao dizem muita coisa. Mas, dao a entender. Um cidadao de Brasilia ou de Buenos Aires, em meio a tanto dinheiro e riquezas circulando, tem muito mais chance de viver bem do que o cidadao de Santiago del Estero ou do Piauì. Ou nao tem? Quem conhece Brasìlia sabe que seis horas da tarde as multidoes se dirigem â estacao rodoviaria do Plano PIloto, para voltarem a suas casas nas cidades satèlites, onde realmente vivem suas vidas comunitàrias e familiares. No outro dia de manhã estarao de volta. Todas as noites de segunda a sexta feira, além dos sàbados e domingos, os centros comerciais e o eixo monumental viram cidade fantasma. Mas, o povao està alegre, là na sua periferia, um churrasquinho na bodega do gaùcho aqui, um leitáo a pururuca na tendinha do mineiro ali, ou as delìcias da gastronomia de buteco nordestina. Espalhados pelas cidades satèlites de Brasília, o povo vai muito melhor do que em suas distantes aldeias natais.  

Jà em Santiago del Estero a coisa tà feia. Eu cruzei a provìncia no sentido sul-norte, num¨ônibus de dois andares e pude ver coisas do arco da velha. A populacao vai fazendo suas habitacoes como dà, com o material mais barato que hà, barro e tijolo. Devido ao frio do inverno, os tetos nao sao feitos de palha, como no Piauì, mas de um tipo de lage, tambèm de barro,  sem telhas ou qualquer cobertura. Assim, as casas se confundem com a pròpria terra, pois náo levam qualquer pintura ou decoracao. Com poucas janelas, facilmente podem ser confundidas com cemitèrios. Aliàs, mais de uma vez fiz esta confusáo e me surpreendi como os tùmulos sao mais bem cuidados do que as residências.  As poucas aldeias e cidadezinhas nao passam de pequenos conglomerados onde as misèrias se encontram, diferentemente do campo, onde a pobreza està espalhada ao longo das estradas e nas propriedades rurais.

Agricultura mecanizada nao se vê. Por isso a diferenca com suas vizinhas Còrdoba e Tucumàn, que parecem jardins de trigo e soja. Aqui em Santiago sò arvoredos secos e cinzas, por causa da secura do inverno. Por horas e horas è a ùnica paisagem que se estende pela imensa planìcie, sem montanhas. Ao lado da estrada pavimentada, os dormentes e trilhos retorcidos da antiga estrada de ferro, abandonada â pròpria sorte, depois que faliu a companhia privatizada no governo Menèn.  Atè que se chega na capital da provìncia.

Santiago del Estero, capital, è algo impressionante. A beleza desta cidade enche os olhos de qualquer um que a contemple. Quintais amplos e arborizados, com espècies frutìferas vàrias,  canais de irrigacao cortam a zona urbana,  jardins gramados e verdes, em imensas àreas de lazer com equipamentos bem instalados.  O centro muito bem conservado, limpìssimo. Parece que estamos na Espanha.

Eu fiquei perplexo com a diferenca e me perguntava de onde vinha o dinheiro dessa gente. Que tipo de atividade econömica bancava tamanha concentracao de riqueza e boa vida? Esse era um daqueles momentos em que estar sozinho è ruim, pois você nao tem como compartir sua perplexidade. Entao, puxei conversa com um argentino, que por acaso, tambèm nao era dali. Tratava-se de um portenho, daqueles que falam pelos cutuvelos, ou seja, pelas máos. Ele pegou apenas a parte que eu elogiava a capital e mandou bala: "Sim, sim, as provìncias estao crescendo que è um assombro, você nao imagina como estao ficando ricas as provincias da regiao de Cuyo e do Sul. Santa Cruz è uma maravilha, nunca se viu tanto progresso .... bla bla bla ..."  e passou a elogiar diretamente os governos Kirchner por tantas benfeitorias. Falava sem parar, sem dar chance a qualquer intervençao de minha parte. Entao,  concluì que puxa-sacos hà em todo lugar, atè em Santiago del Estero, com sua espantosa producao anual de 1700 dòlares por cabeça. 



Santiago del Estero é a terra das Chacareras, o ritmo mais importante da música argentina. De pouca expressão internacional, é o estilo mais apreciado pelos argentinos, espalha-se de sul a norte, de leste a oeste. Não há nada mais importante na cultura argentina, superior ao zamba, ao chamamé e até ao tango. 

Aqui, vemos um grupo se preparando para o festival anual de Cosquim, Córdoba, o maior encontro da música folclórica argentina. 

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