A renda per cápita mais rica das cidades da América
Latina pertence a Brasília, com mais de 24 mil dólares produzidos por
habitante. Para se ter uma idèia, Florianòpolis, considerada uma
cidade rica, nao chega a 5 mil dòlares anuais. O PIB total de
Brasìlia è incríveis 52 bilhoes de dólares, ficando abaixo apenas de Rio e
Sao Paulo. Supera cidades altamente industrializadas e
ricas, como Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Salvador e Recife.
Considerando-se que Brasília só produz governo e articulacoes políticas, que
rendem muito dinheiro mas nos locais que suas excelëncias representam e nao em
Brasília, este è um resultado absurdamente alto, daqueles que, ao invès de serem
comemorados, deveriam ser lamentados, pois indicam profundo equìvoco.
A Argentina tambèm indica grande concentracao de
renda no segmento governo. O PIB per càpita da capital federal,
Buenos Aires, é 15 mil dòlares anuais, enquanto o da Provìncia de Buenos Aires,
que faz o entorno da capital e se estende por larga extensáo do pampa
argentino, náo chega a US$ 4 mil per càpita. E olhe que esta provìncia è
disparadamente a mais rica do paìs. A provìncia mais pobre, Santiago del
Estero, no ano de 2010 produziu o equivalente a 1700 dòlares por habitante.
Nùmeros frios, assim, realmente nao dizem muita coisa. Mas, dao a
entender. Um cidadao de Brasilia ou de Buenos Aires, em meio a tanto dinheiro e
riquezas circulando, tem muito mais chance de viver bem do que o cidadao de
Santiago del Estero ou do Piauì. Ou nao tem? Quem conhece Brasìlia sabe que
seis horas da tarde as multidoes se dirigem â estacao rodoviaria do Plano
PIloto, para voltarem a suas casas nas cidades satèlites, onde realmente vivem
suas vidas comunitàrias e familiares. No outro dia de manhã estarao de volta.
Todas as noites de segunda a sexta feira, além dos sàbados e
domingos, os centros comerciais e o eixo monumental viram cidade fantasma. Mas,
o povao està alegre, là na sua periferia, um churrasquinho na bodega do gaùcho
aqui, um leitáo a pururuca na tendinha do mineiro ali, ou as delìcias da
gastronomia de buteco nordestina. Espalhados pelas cidades satèlites de Brasília, o povo
vai muito melhor do que em suas distantes aldeias natais.
Jà em Santiago del Estero a coisa tà feia. Eu cruzei a provìncia
no sentido sul-norte, num¨ônibus de dois andares e pude ver coisas do arco da
velha. A populacao vai fazendo suas habitacoes como dà, com o material mais
barato que hà, barro e tijolo. Devido ao frio do inverno, os
tetos nao sao feitos de palha, como no Piauì, mas de um tipo de lage,
tambèm de barro, sem telhas ou qualquer
cobertura. Assim, as casas se confundem com a pròpria terra, pois náo
levam qualquer pintura ou decoracao. Com poucas janelas, facilmente podem
ser confundidas com cemitèrios. Aliàs, mais de uma vez fiz esta confusáo e me
surpreendi como os tùmulos sao mais bem cuidados do que as residências.
As poucas aldeias e cidadezinhas nao passam de pequenos conglomerados
onde as misèrias se encontram, diferentemente do campo, onde a pobreza està espalhada ao
longo das estradas e nas propriedades rurais.
Agricultura mecanizada nao se vê. Por isso a diferenca com suas
vizinhas Còrdoba e Tucumàn, que parecem jardins de trigo e soja. Aqui em
Santiago sò arvoredos secos e cinzas, por causa da secura do inverno. Por
horas e horas è a ùnica paisagem que se estende pela imensa planìcie, sem
montanhas. Ao lado da estrada pavimentada, os dormentes e trilhos retorcidos da
antiga estrada de ferro, abandonada â pròpria sorte, depois que faliu a
companhia privatizada no governo Menèn.
Atè que se chega na capital da provìncia.
Santiago del Estero, capital, è algo impressionante. A beleza
desta cidade enche os olhos de qualquer um que a contemple. Quintais amplos e
arborizados, com espècies frutìferas vàrias, canais de irrigacao cortam a
zona urbana, jardins gramados e verdes, em imensas àreas de
lazer com equipamentos bem instalados. O centro muito bem
conservado, limpìssimo. Parece que estamos na Espanha.
Eu fiquei perplexo com a diferenca e me perguntava de onde vinha o
dinheiro dessa gente. Que tipo de atividade econömica bancava tamanha
concentracao de riqueza e boa vida? Esse era um daqueles momentos em que estar
sozinho è ruim, pois você nao tem como compartir sua perplexidade. Entao, puxei
conversa com um argentino, que por acaso, tambèm nao era dali. Tratava-se de um
portenho, daqueles que falam pelos cutuvelos, ou seja, pelas máos. Ele pegou
apenas a parte que eu elogiava a capital e mandou bala: "Sim, sim, as
provìncias estao crescendo que è um assombro, você nao imagina como estao
ficando ricas as provincias da regiao de Cuyo e do Sul. Santa Cruz è uma
maravilha, nunca se viu tanto progresso .... bla bla bla ..." e
passou a elogiar diretamente os governos Kirchner por tantas benfeitorias.
Falava sem parar, sem dar chance a qualquer intervençao de minha parte. Entao,
concluì que puxa-sacos hà em todo lugar, atè em Santiago del Estero, com
sua espantosa producao anual de 1700 dòlares por cabeça.
Santiago del Estero é a terra das Chacareras, o ritmo mais importante da música argentina. De pouca expressão internacional, é o estilo mais apreciado pelos argentinos, espalha-se de sul a norte, de leste a oeste. Não há nada mais importante na cultura argentina, superior ao zamba, ao chamamé e até ao tango.
Aqui, vemos um grupo se preparando para o festival anual de Cosquim, Córdoba, o maior encontro da música folclórica argentina.
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