quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

SALTA, um país dentro do outro

Nas pequenas cidades arborizadas, no inverno se vê as neves saltenhas

Nós que estivemos sob grande influência imigratória posterior à colonização ibérica, não temos ideia do que seja uma nação de raça única. Sabe aquela piada onde um interlocutor diz ao outro "É tudo a mesma coisa" e recebe como resposta: "Mesma coisa é um caminhão cheio de japoneses".   É isso mesmo.  Na portaria do hotel em Cafayate, na escarpa inicial dos Andes Saltenhos, estava um francês tentando se comunicar, em inglês, com a indiazinha da recepção. Depois de acompanhar a tentativa de conversa, e bem metido que sou, tomei a tarefa de indagar ao francês se ele tinha certeza de ter pago os valores adiantados que alegava, e se quem recebeu era mesmo a moça ali defronte. Ele garantia que sim, e parecia sincero nas suas afirmações. Pergunta daqui, investiga dali, a recepcionista acaba descobrindo que foi uma camareira que recebeu o dinheiro e "esqueceu" de anotar na ficha do rapaz. Como poderia o pobre europeu saber que uma não era a outra, já que pareciam idênticas? Os mesmos olhos negros, o mesmo pelo finíssimo a contornar as suaves curvas da nuca,  coxas e braços, a mesma pele macia, os mesmos cabelos longos e pretos, os mesmos lábios carnudos .... êpa, já estou passando dos limites .... Sim, além de parecerem-se iguais, são extremamente sensuais.

As rochas da pré cordilheira

O Trem das Nuvens




















Como bons representantes indígenas, o povo de Salta não se faz de inocente em matéria de libertinagem.  As praças e os escurinhos vivem lotados de casais se amassando, adolescentes de uniforme escolar recém saídas da sala de aula só faltam consumar o ato ali, na frente de todo mundo. Eu imagino o que não fazem depois, quando a noite cai pra valer e todos os gatos são pardos. Em geral as jovens são baixinhas, peitudinhas e bundudinhas, mas também circulam aquelas que parecem modelos de revista, verdadeiras jóias eróticas, digo, exóticas. Noventa e nove por cento da populacão de Salta é descendente de índios. Vinte e cinco por cento ainda vivem em tribos, falando exclusivamente a língua nativa.

Neste e em outros aspectos, Salta é deliciosamente latino-americana. O caso do dinheiro que o francês adiantou e não obteve recibo é coisa rotineira, pois o nìvel de formalização da atividade econômica é precário. Você vai a um restaurante hoje, paga um preço. Amanhã pagará preço maior ou menor, pelo mesmo serviço, a depender do humor do negociante ou do garçom.  O caso é que ele lhe apresenta a conta fechada "Sao 65 pesos". Eu respondo "Não é, não senhor" e explico que o filé com fritas sai por 28, o vinho é 15 e a salada 8, portanto, o total dá 51 e nao é possível que estejam cobrando 30% de comissão. Entao, na maior cara de pau, ele se faz de vítima: "Haa, dá 45 pesos, tá bom?". Replico que "Dou não! Aqui está o correto, 55 pesos" e ambos fazemos as pazes.  

Assim como em todos os demais países e estados da América Latina, é realmente tudo a mesma coisa, pois na Bolivia, Peru, Paraguai, Tucumán, Catamarca, Jujui e Salta, assim como Bahia, Amazonas, Pará, Maranhão e tantas outras sociedades,  quem manda é a elite branca e européia. Isso está impregnado há séculos na alma desses povos, tanto que eles já automatizaram o comportamento para a obediência simples e direta no dia a dia. Cena exemplar: o ônibus de Cafayate chega em Salta e forma-se um aglomerado em torno do maleiro (eles nunca organizam fila para nada, é uma zona total). O maleiro inicia a retirada das malas e as vai distribuindo conforme seja o dono. Achei razoável a idéia, por que otimiza o serviço dele, mas, um cidadão de olhos e pele clara atravessa todo o aglomerado, apresenta seu tícket ao maleiro e este procura especificamente a mala do senhor branco e a entrega. Nao se ouve um pio na “fila”, além da minha revolta em espanhol macarrônico, que ninguém apoiou, nem com um simples olhar. Meu último recurso foi chamar o sujeito transgressor de “ignorante”, mas ele também não me dá a mínima. Pelo jeito, o ignorante sou eu.    E o maleiro ainda me pede uma propina!

Os vinhos de Salta estão entre os melhores do mundo, especialmente os da variedade Torrontés



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